As regras do jogo.

2016 Palavras
Luísa estava visivelmente alterada, se alguém pudesse vê-la. Ela foi até o estacionamento para respirar um pouco. Precisava liberar toda aquela agonia de alguma forma e a única alternativa que Luísa viu para extravasar foi bater por diversas vezes contra o capô do carro. Igor chegou logo atrás dela, tentando acalmá-la. Não entendia o comportamento da garota, parecia que estava com ciúmes e que tentava provocar o outro. Luísa sempre foi uma mulher apaixonante e apaixonada, mas os sentimentos dela duravam uma temporada, no máximo uma primavera inteira ou um verão. Ela era intensa nos amores, Luísa nunca foi mulher de um homem só. Ela não demonstrava sentimentos banais como os ciúmes. Aquela raiva que Luísa experimentava era visceral. — O que está acontecendo com você? O que te deixou assim?— Perguntou Igor, preocupado. — Não foi nada importante, Igor. Eu só preciso ficar sozinha.— disse Luísa, ainda alterada. Ela tentou dar mais um passo para a frente, mas o seu pé cedeu mais uma vez. Agora, sim, ela conseguiu ganhar uma bela de uma torção. Igor precisou ampará-la para que a mesma não caísse. Luísa praguejou palavrões que Igor nunca tinha sonhado em ouvir. — Venha, vou te levar no hospital para olhar isso. — Não, eu não quero. Não foi nada demais. Eu só preciso da minha casa e que avise ao Daniel para que ele se despeça por mim. — Vou mandar uma mensagem para ele. Agora venha, deixe-me de levar.— Igor a carregou no colo sem nenhuma dificuldade. Luísa fez umas caretas, sentindo fisgadas no pé. — Calma… Eu vou ser cuidadoso para não te machucar.— Murmurou Igor, aproveitando-se para sentir as coxas macias dela. Ele estava prestes a colocá-la no carro quando Daniel surgiu como um furacão. — Tire as mãos da minha esposa. Deixe que eu a levo para casa. — Ela acabou de machucar o pé, Daniel. — Ótimo. Então eu a levo no médico.— Daniel praticamente arrancou Luísa do colo do outro. — Aí! O que você está fazendo? Tira a mão de mim, eu não quero a sua ajuda. Eu quero que o Igor me leve. — Você não quer nada, Luísa, deixa de ser mimada. Se não insistisse em usar um salto desse tamanho não teria caído duas vezes. — Ah, agora você quer decidir o tamanho do meu salto?— Perguntou Luísa, com ironia.— Ah, vá para o d***o. Não tenho paciência para suas tolices. Já mandei tirar as mãos de mim, agora! — Ela não quer que você leve, Daniel. Respeite a opinião da moça. — Cala a boca!— Rosnou Daniel, impaciente. O olhar fulminante do mesmo intimidou o outro. — Vai embora, não vou repetir. A Luísa é minha esposa e cabe a mim cuidar dela. Vá cuidar da sua própria vida.— Daniel a manteve suspensa com um braço e com o outro abriu a porta do carro. Ele acomodou a garota no banco estofado e assumiu o volante. — Espera. Não podemos abandonar a festa assim. Precisamos dar uma satisfação aos convidados. — Estou mandando uma mensagem para a Laís e a Bruna. Elas vão fazer isso por nós. Agora fica quieta, porque se realmente foi grave, você não terá condições em continuar com as entrevistas amanhã. — O que?— Perguntou Luísa sobressaltada.— Mas de jeito nenhum. Eu não vou para porcaria de médico, Daniel. Eu estou exigindo que me leve para casa. — Você não exige nada. Eu não sou um dos seus capachos. — Não… Você é uma pedra que entrou no meu sapato. — A pedra que torceu o seu pé não entrou no seu sapato. Então até aí está tudo ótimo.— Rebateu Daniel. — Me poupe das suas ironias sem nenhuma originalidade e sentido. Por que você não vai dar uma carona para a Raquel e me deixa em paz? O Igor ia me ajudar. — Se eu não te conhecesse desde que você usava fraldas e não sabia nem mesmo dizer o seu nome, acharia que está com ciúmes. — Não seja ridículo.— Luísa revirou os olhos. DaVocida com o carro. Sempre era muito divertido provocar a garota. Ele continuou a trajetória mais curta até o hospital. Luísa foi consultada por um médico e de fato tinha torcido o pé. Ela precisou ser carregada de volta para casa, nos braços. — Eu não acredito que vou precisar passar uma semana sem pisar no chão.— Resmungou Luísa, enquanto Daniel a colocou na cama. — Eu quem o diga. Por sorte temos a Dirce para nos ajudar com a casa. Você já é chata demais quando está boa, imagine doente. — Cala essa boca, Daniel. Suplício é eu ter que te aguentar. Ainda por cima você quebrou o nosso acordo. Esqueceu que precisamos manter as aparências sobre o nosso casamento? Ainda não engoli a palhaçada que você fez comigo na festa. — Do que você está falando? Eu não fiz nada. — Você estava flertando com a Raquel na frente de todos!— Explodiu Luísa, incomodada e objetiva. Uma pontada de vaidade cresceu em Daniel. Ele tinha certeza de que Luísa estava com ciúmes e estranhamento ficou muito feliz com a informação. — Eu não fiz nada de mais, apenas estava conversando com a Raquel. Se algo for acontecer, não se preocupe, será em um lugar totalmente privado.— ele levantou o canto da boca em um sorriso malicioso. Luísa precisou se conter muito para não insultá-lo, mas ela era expressiva demais para ocultar os sentimentos. As bochechas da garota estavam vermelhas de tanta raiva. — Você ainda tem o descaramento de falar isso na minha cara? Escuta aqui, você me deve respeito. — Eu sigo muito bem as aparências do nosso casamento, melhor do que você que estava nos braços do meu primo quando eu cheguei no estacionamento. — Eu machuquei o pé, estrupício!— Luísa se alterou novamente. — Escuta aqui…— Daniel inclinou o tronco para a frente.— O nosso casamento é apenas uma faixada. Se eu quiser me relacionar com outras pessoas, se eu quiser ter uma amante, isso não te diz respeito. Você faz questão de lembrar que precisamos esquecer o que aconteceu entre nós. Com a Raquel, terei chances imperdíveis de esquecer tudo o que aconteceu. O nariz pequeno e arrebitado da moça tremeu diante do comentário. Quando isso acontecia era porque ela já havia extrapolado o seu limite do auto-controle. Contudo, Luísa não disse nada. Daniel saiu do quarto dela, satisfeito por ter deixado Luísa sem palavras. Luísa nunca ficava sem palavras. A garota se jogou sobre o seu colchão, bufando de inquietação. Seria um castigo ter que ficar confinada naquela cama e dependendo da ajuda do Daniel. Mas quando Luísa voltasse a andar, ele que a aguardasse. Ela faria com que Daniel pagasse por aquela insolência. … Daniel até experimentou a felicidade de estar por cima - durante um tempo efêmero-, mas Luísa não tornou nada fácil a convivência durante os seus dias de repouso. — Eu não acredito que você vai ser tão mesquinho. Eu estou com o pé imobilizado.— Argumentou Luísa, bem acomodada no sofá da sala de estar. — Eu acabei de te trazer para o sofá, Luísa.— Daniel trincou os dentes. Ele estava sentado no sofá, ao lado dela, e há alguns minutos a televisão ligada servia só para fazer barulho. — Eu mesma iria se pudesse, ou então pediria para a Dirce me ajudar, mas além de que ela não teria forças para me carregar no colo, hoje é domingo, e é a folga dela. Daniel respirou fundo, se esforçando para ter paciência. Ele ficou de pé, desistindo de assistir televisão e carregando a mulher no colo. — Devagar! Não seja estúpido.— Repreendeu Luísa, irritada. — Eu imaginei que era impossível uma pessoa ficar mais insuportável do que o normal.— Resmungou Daniel, caminhando com a moça para a varanda. Ele acomodou a moça na confortável cadeira que tinha ali. — Não deveria ser tão insensível. Não tenho culpa de ter machucado o pé. Daniel respirou fundo, sua paciência já havia esgotado. — Eu vou sair, então é melhor que peça logo de vez o que quer e pare de fazer joguinhos. — Não estou entendendo. O que te faz pensar que eu estou fazendo joguinhos? — Eu te conheço bem o bastante para saber dos seus golpes baixos, Luísa Bolena. Você detesta ser contrariada. — Ninguém gosta. Mas o que isso tem a ver com o fato de eu estar pedindo para o meu então marido me ajudar? Nosso casamento pode ser uma farsa no quesito amoroso, mas é verdadeiro no papel. Você prometeu cuidar de mim na saúde e na doença. — Não prometi nada. Quem nos casou foi um juíz, não um padre. — Melhor ainda. Você tem uma obrigação legal comigo. — A senhora quer mais alguma coisa? Ou prefere continuar me atormentando? — Você vai mesmo sair? — Vou, ou do contrário, você vai me deixar louco. — Isso é apenas uma desculpa para não fazer o seu papel de marido. Eu quero voltar para a cama. Não sei o tempo que você vai demorar e as minhas costas podem doer. Daniel não contestou. Apenas a ergueu antes da mesma falar qualquer coisa. — Aí, Daniel, para de ser bruto!— Protestou Luísa, como sempre. Mas ele não a respondeu. Colocou a garota na cama sem muita delicadeza e arrumou os travesseiros atrás dela. — Eu já abasteci o frigobar caso você sinta sede ou fome, o que não vai demorar muito para acontecer. Até mais tarde.— ele saiu em seguida. Luísa pensou em perguntar de que horas ele voltaria, mas Daniel não deu chance. Saiu em disparada, como o d***o foge da cruz. Ela esperou a porta da sala bater para correr até a janela. Por morar no quintal andar e ter uma ótima visão, Luísa viu que a pessoa que esperava o Daniel era a Raquel. Passaram-se quinze dias desde que ela machucou o pé e já havia um tempo que seu pé não doía mais, porém era divertido fazer o Daniel de serviçal. Luísa pressionou o parapeito das janelas com bastante força, estava indignada com a descoberta. Ela continuou com os olhos bem atentos até o Daniel chegar. Os dois se cumprimentaram com um beijo na bochecha, e Raquel não perdeu a oportunidade de beijar o homem no canto da boca. Daniel esboçou um sorriso de canto com a atitude da outra. — Sem vergonha.— Luísa socou o parapeito da janela com as duas mãos. Daniel abriu a porta do carro de aplicativo para a moça e entrou logo depois. Luísa não saberia explicar de onde vinha tanta raiva, mas estava se sentindo afrontada. Ela nunca havia ido com a cara da Raquel e sequer a convidou para a festa da “ Conectando, América”, a mesma havia ido como convidado de alguém. Com tantas mulheres no mundo, Daniel precisava ter escolhido logo aquela? — Eu não vou deixar isso barato, Daniel. É guerra que você quer? É guerra que você vai ter.— Luísa voltou para a cama, segurando o seu celular que estava sobre a cabeceira. Ela entrou no aplicativo de conversa e logo mandou uma mensagem para Igor, torcendo para que o mesmo respondesse rápido. “ Eu estava pensando em você. Como tem passado? Não nos falamos mais.” Luísa mordeu os lábios diante da resposta do Igor. Em seguida, ela enviou um áudio de voz. — Acredita que o teu primo saiu com a Raquel e me deixou aqui sozinha? Eu não estou conseguindo encostar o pé no chão, preciso de ajuda. Não quer vim aqui cuidar de mim?— Luísa enviou em seguida. Igor não demorou nada para responder. “ Eu chego em vinte minutos. Quem sabe uma massagem não ajude a melhorar a sua dor do pé?” Luísa riu alto, já sentindo-se vingada. Daniel teria uma grande surpresa quando voltasse e encontrasse com o seu primo que ele tanto tinha ressalvas.
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