CAPÍTULO TRÊS

1650 Palavras
Tudo era contado á Gabriel, seu amigo. Entre os jogos de mesa e alimentar os pássaros, Samuel discorria sobre seus planos de conquistá-la. Passou a ir pelo menos uma vez por semana na cidade onde ela morava.E por diversas vezes, fingia não a ver, como lhe instruíra  sua mãe. Por mais que seu coração disparasse, suas mãos ficassem suadas, ele fingia que estava ali porque gostara da igreja e não por causa dela. Poucas vezes ela o parou, só o cumprimentava com educação, como fazia com todos. Três meses após ele frequentar a cidade que ficava bem distante da sua, resolveu parar em uma sorveteria próximo à igreja para comprar uma água para beber na estrada, e lá estava Giulia. Sentada e sozinha. Samuel sentiu seus joelhos vergarem, mas se dirigiu até o balcão e pediu sua água, fingindo não vê-la. Segundos preciosos se passaram e ele entrava em desespero, pois sabia que ela o havia visto, mas não o chamara. Ele já xingava internamente e dizia que não mais pisaria os pés naquela cidade, em sua mente, ele prometia  quando, ao pegar o troco e se virar, viu que ela chorava. Isso o abalou. Seus olhos se cruzaram quando ele se encaminhou como se fosse para a porta, e ali ele viu dor, mágoa e seu coração se enterneceu. Sentou-se ao seu lado e pegou sua mão. Era quente e macia. Ela sorriu e tentou disfarçar o choro. —  Olá, Samuel, como está? —  Estou bem, mas você parece que não, não é? —  Estou sim, meu amigo, só passei aqui um pouco para relaxar. Olhe, me lembrei de seu nome. Sim ,mas me chamou de amigo –  Ruminava o rapaz. —  Se sou seu amigo, gostaria de ajudar, por favor. —  Sério, estou bem mesmo. Você realmente gostou daqui, não é? Tenho te  visto muito por aqui. Não é muito longe para vir? —  Sim, gostei muito, o pessoal é acolhedor, tanto que não me importa a viagem. Conversaram coisas aleatórias e amenidades, como qual música mais gostavam, pediram sorvete, o rapaz foi extremamente educado e respeitoso. Ele adorava seu cheiro. Seus cabelos pareciam que haviam acabado de serem lavados e seu cheiro era de limpeza, simples assim. Sabonete de hortelã. Emanava força dela, e ele reafirmou que sabia desde que a conhecera que ela era especial. Era exatamente como ele imaginava. Ali, apenas os dois, ela se mostrava relaxada e seu sorriso iluminava tudo. Samuel  viu que estava mesmo perdidamente apaixonado por ela. —  Você é especial, Samuel –  lhe disse ela, com sua voz doce e macia, e era para ele que ela falava aquilo. Era surreal.  —  Imagina, Giulia, sou só um rapaz comum que viu uma amiga chorando em uma sorveteria e parou para trocar idéias, só isso. —  Não te enganei, não é? –  perguntou, baixando a cabeça, envergonhada. —  Me desculpe, não quis ser indelicado. Não precisa falar sobre isso, o que acha de falarmos sobre os sabores  variados de sorvetes? Após uma gargalhada que deixou o coração do jovem rapaz liquefeito, ela concordou: —  Ok, Macadâmia, o que acha? —- Não sei. —  Não provou ainda esse sabor? É uma delícia. —  Já sim, eu disse Não Sei, porque é um sabor que tem ali, você não viu? Achei legal esse nome de sorvete, quem será que inventou um sabor de sorvete chamado Não Sei? Outra vez ela gargalhou e ele pensou que faria tudo para que ela gargalhasse mais. Ela jogava a cabeça para trás quando gargalhava e deixava seu pescoço perfeito à mostra. Quando ela sorria, fechava os olhos e ficavam apenas fendas. Ele nunca vira alguém sorrir de forma tão majestosa. —  Me sinto melhor agora , sabia? –  ela o olhava feliz. —  Realmente eu não estava bem. Sato anunciou seu noivado hoje, não sei se você soube. Como podia seu coração bater assim tão rápido? O que ela quis dizer com aquilo? —  Sinto muito. –  foi só que ele soube dizer. Ela estava apaixonada por aquele nanico quadrado do Sato, era isso mesmo? Não podia ser. —  Sim obrigada, mas talvez seja melhor. Nem sempre podemos ter o que queremos. Seus olhos marejaram e ficaram vermelhos, prenunciando mais choro e Samuel se sentiu impotente e meio doente. Ele sentia muito e sentimentos avassaladores que o rasgavam por dentro. Como podia doer fisicamente? —  Há algo que eu possa fazer? – perguntou-lhe. —  Você é um amor. –  apertou sua mão sobre a mesa e ele teve vontade de puxá-la bruscamente, pois ela conspurcou um amor tão doce. Destroçara tudo dentro dele irremediavelmente. —  Eu gostaria que houvesse algo, mas Deus sabe o que faz, não é mesmo? Temos que ter cuidado com o que pedimos. Ao dizer isso, uma lágrima solitária escorreu em sua face perfeita. Ele queria lhe tirar aquela dor, ao mesmo tempo em que queria lhe xingar. Arrastou a cadeira e a abraçou. Ela se encostou em seus ombros e deu vazão às lágrimas represadas. Samuel lhe deixou em casa. Agora sabia onde ela morava, finalmente, mas do que isso lhe serviria, se o coração dela sangrava por outro? —  Você acha que  café combina com sorvete? –   questionou-lhe quando desceu do carro, em frente a uma casa de dois andares, muito bonita e rodeada de flores. Ali era onde seu amor dormia e acordava. —  Desculpe? —  Eu gostaria de lhe oferecer um café antes de você pegar a estrada, é o mínimo que posso fazer após ter molhado toda a sua camisa. —  Café combina com tudo, até com sorvete de sabor Não Sei, garota. Sim, se sentia um masoquista. Devia ir logo para sua casa, chorar em seu quarto, desabafar com sua mãe ou seja lá o que fosse fazer, mas ficar mais um tempo com ela, conhecer sua casa, era como um canto da sereia e ele entrou. Giulia tinha duas irmãs. Calyla e Kyara. Eram muito parecidas à irmã, só eram menores. —  O que fazem acordadas? –  A irmã mais velha fingiu que estava brava. —  Você demorou! Foi à sorveteria, né, eu sabia. –  Questionou, indignada, a mais velha, que deveria ter uns treze anos —  Você sempre vai, quando está triste e está me parecendo triste. —  Você está triste, por quê ? –  agora era a mais nova, que devia ter uns nove anos. —  Não, eu não estou triste, e já que estão acordadas, venham conhecer Samuel, ele me deu uma carona. Os pais de Giulia  já o  conheciam desde a última vez que foram à sua cidade e depois disso, na igreja aqui, na cidade deles. Foram amáveis com Samuel, lhe fizeram café, deram-lhe bolo e, quando deu por si, estava vendo fotos em álbuns. Já passava das duas da manhã, quando ele foi para sua casa . Seu maxilar estava travado com a lembrança de tudo o que Giulia lhe falara. Ela gostava de Sato, desde os quinze anos, mas nunca foi correspondida. Ele sempre fora amável com ela, e não lhe passara despercebido, a paixão da jovem, porém ele nunca lhe magoou com esperanças, pois a respeitava e não a via dessa forma. Ficou noivo de Ciry, sua namorada de três anos e muito amiga de Giulia. Samuel só pensava em quão i****a Sato era. Como podia dispensar uma mulher como Giulia? Ele conhecera Ciry e a achara muito legal, mas não entendia o motivo de Sato. Ficou dois dias sem querer conversar com ninguém, deprimido, só queria pensar.  Evitou Gabriel quase a semana toda e quando o viu, estava calado e seu amigo percebeu: — Questões do coração?.  – Questionou-lhe, quando ele finalmente foi à praça no seu horário de almoço. —  Sim, problemas. —  Quer falar sobre isso? —  Obrigado, mas não há muito o que falar. Ela está apaixonada por outro, é isso. –  Dizer isso em voz alta, lhe doía como um  punhal no peito. —  Sinto muito, mas tudo tem uma razão de ser, não é? Talvez não seja a vontade de Deus. E temos que ter cuidado com o que pedimos, talvez o que achamos que seja nosso, que seja um direito nosso, pode não ser... —  Como?! –  Vociferou o rapaz,  interrompendo o que o senhor dizia e lembrando-se que Giulia tinha usado mais ou menos essa frase, referindo-se a Sato, assustando Gabriel, saiu, derrubando a mesa improvisada que fizeram sobre o colo do amigo, com uma tábua, ao se levantar. —  Sempre fui fiel a Deus e temente, obediente, andei reto… e o que ganho quando quero uma mulher que eu amo? Que ela ama outro, você acha isso justo?! Mas não esperou o outro responder e lhe deu as costas, voltando para a empresa, irado. Como agora sabia o caminho, apareceu sem avisar na casa de Giulia, uma hora antes do culto começar.  Foi muito bem recebido por todos, que lhe deram a ideia de irem todos no mesmo carro e deixar o dele na garagem. O pai da moça, tinha uma camionete enorme, cabiam todos e sobrava espaço. Ela estava radiante. Linda em um vestido simples e leve. Não parecia estar sofrendo, não igual ele, ou pelo menos, escondia como ele. Após o culto, voltaram cantando no carro e passaram todos na sorveteria. Aquela era a ideia agora. Ele ia ser seu amigo, talvez até confidente. Só não podia ficar sem vê-la. A noite foi tão fantástica, que ele ligou para sua mãe e passou a noite no quarto de hóspedes da casa de sua amada. Sorriu ao contar para mãe que foi Giulia quem lhe pediu o sorvete, e de macadâmia, ele escolheu para ela o de nome Não Sei. Samuel conhecia bem sua mãe, como ela também o conhecia e pôde perceber um tom de tristeza em sua voz, ao perceber que o filho insistia em um amor que não lhe correspondia e que amava outro.
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