Carol
Há um dia da data da entrevista, minha passagem estava comprada, Bárbara ficou de passar aqui no final do dia, eu ainda não tinha contado a ela sobre o que havia acontecido. Eu sabia que iria ouvir um "Eu te avisei, não avisei?", mas Bárbara era a minha melhor amiga, eu não podia evitar isso.
Preparei um jantar para nós duas, mesmo sabendo que ela não ficaria para comer. Desde que se mudou daqui e foi morar com o namorado, Bárbara sempre tem pressa de chegar em casa, e passa pouco tempo fora de lá, sempre afobada e apressada. Aliás, não me recordo de termos saído só nós duas depois que ela começou a namorar o Luan, os únicos lugares para onde vamos, é ao mercado. Imagino se ele a proíbe de alguma coisa, mas acredito que Bárbara não iria aturar ser controlada ou dominada, é o que eu acho. O Luan é um cara legal, aparentemente, eu não o conheço muito bem e nem passei tanto tempo com ele para isso, mas ele parece fazer minha amiga feliz, então para mim basta.
Terminei de colocar a mesa e a campainha tocou, Samuel não voltou mais a me procurar, o que para mim é um alívio, nunca mais quero vê-lo, que suma para sempre. Bárbara irá jantar comigo e eu não vou aceitar um não como resposta.
- Amiga! - ela me abraçou forte, como se já soubesse o que tinha acontecido. - O que houve? Você fugiu de mim todos esses dias.
- Senta, eu fiz uma comidinha pra gente, e antes que você diga que não, eu não vou aceitar, estou precisando muito da minha amiga.
Bárbara suspirou, mas se sentou.
- O que aconteceu? Onde está o Samuel?
Eu comecei a servi-la, enquanto começava a contar o ocorrido.
- Samuel e eu terminamos, eu o peguei naquela noite em que fomos ao mercado, com uma mulher em minha cama.
- Meu Deus do Céu, Carol. - disse, com uma mão sobre a boca. - Aquele filho da p**a desgraçado! Eu sabia que ele não valia nada, eu te falei, não te falei?
Eu não falei para vocês?
- Sim, você falou, amiga. Eu devia ter te ouvido.
- Me conta, você confrontou ele?
- Sim, é claro. Primeiro eu sai atordoada de carro, mas depois eu me dei conta de que estava deixando minha casa para os dois, então eu voltei.
- Carol! Você poderia ter sofrido um acidente, porque não me ligou? Eu teria vindo.
- Eu não queria te incomodar, amiga.
- Não seria incomoda algum! Você é minha melhor amiga, devia ter me chamado e eu teria dado uma porrada na cara dele.
Eu sorri, sabendo que ela seria mesmo capaz.
- Eu o expulsei daqui, joguei suas roupas pela janela.
- É sério? - ela ri - Muito bem feito.
- Você acredita que ele quis me fazer passar por louca? Disse até que eu estava vendo coisas. Canalha!
- Que i****a! E você? Como você está agora?
- Eu estou tentando ficar bem, Babi, de verdade. Mas tem horas que é muito difícil.
- Eu imagino, minha amiga.
- Ba, eu tenho uma entrevista de emprego amanhã em São Paulo.
- Uma entrevista em São Paulo? Mas porque? Ah, não me diga que...
Eu confirmo.
- Eu não posso mais ficar nessa cidade, eu não consigo, preciso ir embora.
- Mas tem que ser para tão longe? Vai me abandonar aqui? - diz, com tristeza.
- Amiga, eu nunca vou te abandonar, sua boba. Eu vou te visitar sempre, e você também pode ir me visitar, não é? E você também tem o Luan.
- É, eu tenho. - estranho sua melancolia.
- O que foi? Você e o Luan estão bem?
- Sim, estamos sim, não se preocupe. - diz depressa - Só estou triste com essa notícia. Onde é essa entrevista e para que?
- Para o cargo de diretora de criação em uma grande agência de publicidade.
- Seria uma oportunidade incrível.
- Seria sim, Ba. Tudo o que eu quero é um emprego na área e até hoje eu não consegui.
- Eu te entendo, amiga. Não estou animada com a notícia, mas eu torço para que você consiga esse emprego, de verdade. - ela estende a mão sobre a mesa e aperta a minha.
- Obrigada, amiga. Mas vamos com calma, ainda preciso passar. - eu rio.
- Eu não tenho dúvida de que você irá passar, Ca.
- Só você mesmo para confiar tanto em mim.
- E você já contou para o seu pai?
- Ainda não, estou esperando passar essa entrevista e ver o que vai dar, depois eu conto.
Desde que minha mãe faleceu há 10 anos atrás, o meu pai fez o papel de pai e mãe e criou meu irmão e eu sozinho, da melhor forma que pode. Não foi fácil, não gosto nem de lembrar do dia em que recebi a notícia de sua morte, eu senti que fosse morrer junto. Contudo, naquele dia também, eu conheci aquele gato, e...
- Carol, você ainda lembra dele, não lembra? - perguntou, como se tivesse lido meus pensamentos.
- Dele quem? - fingi não saber.
- Do cara do resort. - ela suspirou.
Eu assenti.
- Lembro muito.
- Você nunca mais soube dele?
- Não. E como eu saberia? Eu nem sabia o nome dele e parte disso é minha culpa. Eu devia ter perguntado.
- Devia mesmo, amiga. - Bárbara me fitou com pena, eu sabia o que ela estava pensando.
Daquela única vez, na minha primeira vez, eu tinha ficado grávida para o meu desespero. Minha mãe tinha acabado de falecer, minha família estava em frangalhos, eu fiquei desesperada. Eu não sabia nada sobre ele, nem mesmo seu nome. Mas, por ironia do destino, eu sofri um acidente e caí da escada da faculdade ao escorregar no piso molhado, e perdi o bebê. Eu não fiquei feliz, pelo contrário, mas não posso negar que parte de mim ficou aliviada por não estar mais grávida de um cara que eu nem sequer conhecia, eu nem ao menos tinha falado nada para o meu pai. Eu também não tinha mais voltado ao resort, porque voltar lá seria como reviver a notícia da morte da minha mãe de novo, então embora eu quisesse muito encontrar o gato sem nome, eu não iria mais voltar àquele lugar. E por Deus! Eu quis muito encontrá-lo, e quando eu conheci o Samuel, eu me apaixonei por ele perdidamente, eu acreditei que ele fosse o homem da minha vida, mas eu nunca esqueci aquele homem, seus olhos, seu toque, seu cheiro. Eu nunca vou esquecer, mas deveria. Hoje ele já deve estar casado e com filhos.
- Se você não tivesse perdido o bebê...
- Bárbara, eu não quero falar sobre isso.
- Tudo bem, não vamos falar então. Eu preciso ir agora, Luan deve estar preocupado. - disse, se levantando.
- Mas você acabou de chegar. - reclamei.
Ela me ofereceu um dos seus sorrisos condescendentes.
- Eu te ligo amanhã para saber como foi a entrevista, ok?
- Tudo bem, amiga.
- Boa sorte, tá? Amo você. - diz, me abraçando.
- Obrigada, também te amo.
Depois que minha amiga foi embora, lavei a louça e me deitei. Amanhã eu pego o avião bem cedo, preciso estar descansada para a entrevista.
Na manhã seguinte, acordei cedo e me arrumei. O voo estava marcado para às 8h00, então eu precisei me apressar. Tomei um café rápido e peguei um táxi para o aeroporto.
Cerca de 1h depois, eu cheguei em São Paulo, do aeroporto, peguei um táxi para o endereço da agência. Eu não sabia me locomover muito bem nessa cidade, tinha vindo visitar minha tia aqui só algumas vezes.
Cheguei ao endereço que constava no anúncio da vaga e parei a fim de contemplar o grande prédio que se entendia esguio em minha frente. Era imponente e inspirava riqueza e sofisticação. Respirei fundo e entrei, me dirigi à recepção onde uma moça se ocupava em falar ao telefone.
Esperei que ela terminasse e me notasse ali parada em frente a ela. Finalmente ela desligou o telefone e voltou seu olhar para mim, sorrindo forçado.
- Pois não?
- Eu tenho uma entrevista de emprego com o Sr. Fernando Ramos.
- Só um minuto. - disse, me olhando dos pés a cabeça, enquanto checava algo no computador. - 3° andar, é só se dirigir a secretária dele. - disse seca.
- Muito obrigada.
Entrei no elevador e apertei para o andar informado. Por um momento me senti perdida quando a porta do elevador abriu, tantas eram as portas. Me concentrei em encontrar a porta com o nome do Sr. Fernando e sua secretária.
- Com licença, tenho uma entrevista com o Sr. Ramos.
- É só aguardar que daqui a pouco será chamada. - disse sorrindo.
- Obrigada.
Me acomodei em dos sofás em frente a mesa da secretária, imaginando se eu tinha feito a escolha certa em vir para essa entrevista. Contudo, agora já era um pouco tarde para voltar atrás.
Chris
- Camila, por favor, agende um horário com um bom corretor de imóveis. - pedi a minha secretária.
- Pois não, Sr. Salinas.
Entrei em minha sala e logo o Fernando entrou atrás.
- Vai comprar uma casa? - ele quis saber.
- Estou pretendendo. Estou cansado daquela casa enorme só para mim.
- E o que irá fazer com ela?
- Vou alugar. - dou de ombros.
- E pra onde vai se mudar?
- Para um bairro menor, com vizinhos.
Fernando ri alto.
- Com vizinhos? Você nem gosta de gente.
- Deixa de ser palhaço, Fernando. Eu só... estou cansado da solidão.
- Cansado da solidão? - ele ri. - Você sempre está rodeado de mulher.
- Não estou falando desse tipo de solidão, eu só quero uma casa menor.
- Entendi. Espero que encontre a casa perfeita então.
- Tudo certo para as entrevistas? - pergunto, apanhando algumas pastas para a reunião que eu tenho agora pela manhã.
- Tudo sim, as candidatas já começaram a chegar.
- Confio em você para escolher a melhor profissional para nossa agência.
- Pode deixar comigo, chefe. Vou nessa, boa reunião.
- Boa entrevista.
Terminei de arrumar os documentos para a reunião e me dirigi rumo à sala de reuniões.
- Por favor, Camila, providencie café para todos os membros da reunião. Eu gostaria também que fizesse a ata da reunião.
- Pode deixar, Sr. Salinas.
Camila pegou seu bloco de anotações e seguiu comigo. Não pude deixar de notar como ela tinha uma b***a incrível, seria uma delícia ter ela na minha cama qualquer dia, quer dizer, na minha cama não, melhor no sofá do meu escritório. Não quero mais nenhuma mulher enfiada na minha casa, na minha cama.
Todas as pessoas já haviam chegado para a reunião, elas se levantaram quando entrei pela porta.
- Bom dia, senhores. - cumprimentei, ocupando a cadeira principal.
- Bom dia. - responderam em uníssono.
- Vou buscar os cafés. - disse Camila.
Eu assenti.
- Vamos começar enquanto minha secretária providencia os cafés.