Na manhã seguinte, logo cedo, os cultivadores se reuniram para o desjejum e aguardaram a chegada de He Hua e He LiAn para tocarem no assunto da transferência da herdeira He para o Recanto das Nuvens. Lan XiChen, por mais que usasse seu autocontrole ao extremo, estava com os pulsos cerrados na presença do Líder He, que dissimulava as palavras e ainda fazia insinuações sobre o noivado de sua filha com Jiang Cheng.
Quando as duas primas adentraram o salão, foi possível observar a expressão de dor que tomava a face de He Hua. Seus movimentos eram mecânicos, torturantes, sendo necessário muito esforço para que ela se mantivesse em pé, firme como estava, porém, amparada por He LiAn.
Lan XiChen não conseguiu mais manter-se no seu lugar e levantou-se rapidamente, oferecendo seu braço para apoiá-la.
“Senhorita He Hua, não se esforce muito...! Tudo ficará bem! Eu lhe garanto!” Sussurrou ao seu ouvido.
He Hua já estava a par do plano do Líder Lan e seu coração bateu freneticamente ao sentir o toque de seu amado e ouvir sua voz suave e reconfortante.
“Líder Lan, não é necessário ampara-lá!” O Líder He se adiantou. “Minha filha é forte e já está recuperada!” Deu um riso exagerado.
A vontade de Lan XiChen eram cortar o Líder a sua frente em pedaços com a lâmina de sua espada, mas não poderia fazê-lo, porém, não pode disfarçar o olhar mortal que lançou para o velho Líder.
Após ajudar He Hua a se sentar em seu lugar, Lan XiChen percebeu que grossas faixas a baixo das vestes de sua amada foram postas sobre suas feridas. Seu desejo era retirar toda a dor que sua amada deveria estar sentindo nesse momento e transferir para si, mas isso não era possível. Retomou seu juízo e se dirigiu ao seu lugar, aguardando a refeição terminar para colocar em prática seu plano.
A todo momento, volvia seus olhos para a mestra que lhe roubara o coração. He Hua esforçava-se para parecer normal e suave em seus movimentos, mas sua expressão de angústia e dor não deixava sua face. Em alguns momentos, pareceu ficar tonta e precisou segurar-se a mesa, de olhos fechados, para recuperar o equilíbrio. Lan XiChen, nesses pequenos momentos, quase abandonava sua compostura, mas conseguia controlar-se ainda que isso lhe tomasse grande força.
“Líder He, vejo que sua filha não está em seu bom estado de saúde!” Wei WuXian jogou a isca, iniciando a conversa.
“Oh, não! Não se preocupem! Ela está bem!” Gargalhou nervosamente. “Não é, minha filha?” Direcionou um olhar autoritário para He Hua.
Ela não teve coragem de responder, nem ao menos desmentir seu pai.
“Acredito que seu julgamento esteja errado sobre as condições de saúde da sua própria filha!” O patriarca insinuou, não guardando nenhuma face diante da situação e surpreendendo ao velho Líder. “A senhorita He Hua está precisando de cuidados médicos imediatamente!” Foi mais firme dessa vez.
“Perdoe-me, patriarca, mas eu sei cuidar de minha filha e aqui em GuangKou temos muitos médicos de reputação ilibada!” Retrucou, já aparentando certo desconforto.
“E nenhum desses médicos foi chamado para atender a He Hua, de acordo com o que os meus cultivadores observaram nesses últimos dias!” Jiang Cheng blefou, sabendo que da conversa que ele e Lan XiChen tiveram com seus cultivadores, não descobriram mais nada além do que já sabiam e não querendo que suspeitas recaíssem sobre He LiAn.
Sentindo-se acoado, o Líder He se defendeu.
“Bem, eu não achei necessário...” esquivou-se.
“Levaremos He Hua para GusuLan!” Lan WangJi se pronunciou, provocando um arrepio na espinha do velho líder, assustado com a posição do Cultivador-Chefe.
“Eu-eu não acho que seja preciso...” titubeou. “Filha, diga à HanGuang-Jun que você está bem!” A intimidou.
He Hua estava tão consternada devido a situação, que não conseguiu abrir a boca para falar. Sabia que se concordasse com eles ou se simplesmente se calasse, seria punida novamente, mas não conseguia recusar o abrigo que seu amado havia proposto.
“Tenho que zelar pela vida dos herdeiros das seitas e levarei He Hua comigo!” Lan WangJi falou mais uma vez, com a voz em um tom mais alto que o normal.
O Líder He percebeu que estava sem saída e rezou em pensamento para que sua filha recusasse, mas ela permaneceu em silêncio. Temeu que se ela fosse a GusuLan, ela revelaria o real motivo de sua saúde fragilizada.
Não tendo como fugir de tal ordem do Cultivador-Chefe, organizou um plano em mente.
“Bem, neste caso, eu aceito enviar minha filha a GusuLan para que sua saúde seja avaliada, porém, não seria bom para sua reputação viajar sozinha na companhia de quatro mestres homens...” começou a argumentar.
“O Líder He está questionando nossa honra?” Jiang Cheng levantou a voz, incomodado com tal insinuação.
“Não! Não! Por favor, não me entenda m*l, Líder Jiang!” Se pôs na defensiva novamente. “Só estou tentando zelar pela reputação de minha filha! Seria benéfico se esperássemos alguns dias para que algumas mestras cultivadoras retornassem de sua missão e acompanhassem minha filha a GusuLan!” Arguiu.
“Não temos tempo! A senhorita He Hua precisa ser tratada de imediato, além do mais, quanto menos pessoas souberem da transferência dela para GusuLan melhor! Ainda não sabemos em quem podemos confiar!” Wei WuXian ponderou.
“Compreendo...!” O Líder He se deu por vencido, mas ainda sim precisava manter a vigilância sobre a filha. “He LiAn, você acompanhará sua prima e tomara conta dela!” Ordenou.
He LiAn sabia que seu tio faria tal pedido para que ela seguisse junto a He Hua para essa viagem.
“Partiremos de imediato e em segredo! Os cultivadores Lan e Jiang permaneceram em GuangKou e nos manterão informados sobre qualquer problema que houver aqui!” Jiang Cheng encerrou a questão e o Líder He se viu impotente diante dos líderes das seitas, o Cultivador-Chefe e o patriarca Yiling.
Os preparativos para a partida das primas se deu em silêncio, sem alarde e sem levantar suspeitas. Em menos de uma hora, He Hua saiu do salão de refeições e foi até a carruagem que a esperava, acomodando-se para a longa viagem por terra que a esperava, já que subir o rio nessa época do ano era inviável, sendo possível apenas viajar descendo as correntezas dessas águas.
Ao afastarem-se da cidade, Lan XiChen pediu permissão a He LiAn e esta deu seu lugar na carruagem para o Líder Lan, enquanto subia na montaria deste para que a viagem não fosse interrompida.
“Senhorita He Hua...” Lan XiChen sentou-se ao lado da amada, não resistindo ao desejo de levar sua mão a face da mestra. “Perdoe-me por tirá-la às pressas de sua seita e não ouvir sua opinião antes de tomar essa decisão!” Desculpou-se.
“ZeWu-Jun, eu não queria preocupá-lo com meus assuntos...” He Hua falou, com a voz fraca, demonstrando toda a sua fragilidade.
“Em breve, tudo isso será passado! Nunca mais permitirei que seu pai ou qualquer outra criatura a fira!” Afirmou.
He Hua sabia que estava segura ao lado de seu amado e deixou-se levar pela sensação de bem-estar que sentia apenas em sua presença.
Seus lábios se aproximaram e um beijo aconteceu. O beijo que Lan XiChen tanto ansiava sentir novamente. O beijo de paz e plenitude que He Hua sentia junto ao toque suave e sereno do homem que lhe mostrou verdadeiramente o que era o sentimento mais intenso e profundo.