Peguei minha bolsa e me vesti antes de ir para a casa de Ithan. Jane e ele foram na frente, logo os alcancei. O velho Jeff nos esperava, angustiado, na varanda, se segurando na coluna lateral da entrada. Seus olhos mostravam que por ali correram lágrimas recentemente.
— Meu pai! Que saudades eu estava! — falou Jane, soltando Ithan e abraçando seu velho pai. Lágrimas molharam o rosto do ancião.
— Os espíritos sabem o quanto eu me arrependo, minha filha! O quanto eu chorei por não ter você mais na minha vida, por não ver meus netos crescerem... — sua voz saiu abafada entre os braços da filha.
— Está tudo bem, pai. Eu vim para ficar. Voltei e agora não fugirei mais! — sua voz era de alegria. Jeff colocou suas mãos no rosto da filha e deu um beijo sincero em rua testa. — Pai, podemos entrar? Preciso ter uma conversa com esses jovens.
— Claro, minha filha. Podem ir para o quarto do Ithan. Vou pedir para algum dos funcionários da cabanha trazer uma refeição farta para vocês. Sei muito bem da fome dos lobos — falou, secando as lágrimas.
Seguimos para o quarto do Ithan. Ao entramos, eu e ele nos sentamos na cama e dessa vez, eu que o abracei! Sua mãe se abaixou na nossa frente e pegou as mãos de seu filho entre as suas.
— Meu filho, eu acho que você precisa saber de algumas coisas sobre o passado de sua mãe.
— É o que eu espero. Toda a verdade, mãe.
Ela colocou uma das mãos no rosto do filho. Parecia que estava escolhendo as melhores palavras.
— Nem sei por onde começar... — abaixou o olhar.
— Comece me dizendo por que você me escondeu a vida toda que era uma loba — sua voz era exigente.
— Bem, eu tinha 15 anos quando os espíritos falaram comigo a primeira vez. Me revelaram que eu fui escolhida para ser a defensora da tribo, me transformaria em uma loba por que a tribo estava correndo riscos. Não tinha como fugir ao meu destino e então, aceitei minha sina. Ao longo dos dias, os espíritos falavam comigo novamente, me preparando e me guiando. Falaram que eu era a mais forte da minha geração e que somente eu seria necessária para derrotar os inimigos que se aproximavam. Me prometeram que após vencer três tentativas de ataques, eu seria liberta. Não precisaria mais me transformar e poderia ter uma vida normal e assim foi. Os anciãos da tribo sabiam de tudo, mas não contei para mais ninguém, para não causar alarde na tribo.
Contou uma história que eu já tinha ouvido, mas não tão detalhadamente.
Ela continuava abaixada, segurando as mãos de seu filho. Sua voz era nostalgia pura.
— Minha transformação foi difícil. Eu era a única, não tinha ninguém para compartilhar a minha dor, mas foi melhor assim. Eu não queria que ninguém passasse pelo que eu estava passando. Duas semanas após a transformação, o primeiro frio apareceu. Estava fraco, a muito tempo não caçava, foi fácil derrotá-lo. Dois anos depois apareceram mais dois frios. Sabiam que eu havia matado o outro vampiro e vieram atrás de mim para vingar a morte do amigo. Foi uma batalha difícil, eu estava sozinha, mas eu consegui vencer, faltava apenas um para eu me libertar dessa vida.
Fez uma pausa. Vacilou. Acho que ela não sabia se deveria falar o que vinha a diante, mas por fim, continuou.
— Billy Black me ajudou bastante, ele era o meu noivo, estava sempre ao meu lado, mas não sabia das minhas batalhas, não queria preocupá-lo. Seis anos após minha transformação apareceu um vampiro ardiloso. Ele atraiu uma menina da tribo, jovem, uns 14 anos eu acho e a levou para os limites da reserva, estava prestes a mordê-la. Eu acredito que ele não queria matá-la, mas sim transformá-la em uma vampira também. O fato é que eu cheguei na hora certa de impedir isso de acontecer. Ele tentou me inebriar com sua sagacidade, mas seus poderes não adiantavam de nada contra mim. Consegui derrotá-lo e fiz a menina prometer que não falaria nada para ninguém.
— E quem era essa menina? — não me contive. Estava curiosa.
— O nome dela era Sue — seus olhos voltaram-se para mim.
Minha mãe quase se tornou uma vampira?
— Minha mãe? — paralisei. — Você salvou minha mãe?
— Sim, Leah. Não foi culpa dela, foi o vampiro que a enfeitiçou, mas eu consegui acabar com ele. Estava acabado. Não precisava mais cuidar da tribo. Os perigos já haviam sido destruídos e eu já podia ter uma vida normal, casar, ter filhos com o Billy. Contudo os espíritos ainda me reservaram uma surpresa — suspirou profundamente.
Ithan não tirava os olhos dela. Uma enxurrada de informações estava o atingido, bem no seu momento mais frágil. Apertei mais meu braço ao redor de seus ombros e Jane continuou.
— Meu pai havia acabado de construir uma pequena venda, onde hoje é a cabanha. Ele pretendia atender os operários que estavam trabalhando na estrada que ligaria Forks a Seattle, passando por dentro da reserva. Eu e meus irmãos o ajudávamos na venda e foi aí que minha vida mudou quando um operário entrou por aquelas portas.
— Meu pai? — Ithan perguntou.
— Sim, seu pai. Tive um imprinting imediatamente quando encontrei com seus olhos e ele também se apaixonou por mim. Contei para Billy primeiro e ele me amava tanto que aceitou me perder, me deixou livre para que eu pudesse seguir minha vida e ser feliz. Namoramos escondido um tempo, eu contei sobre minha vida, mostrei minha forma de loba e seu pai entendeu, me amava incondicionalmente, mas eu tinha medo de falar com seu avô, só que eu não precisei contar. Ele descobriu sozinho e obviamente não aceitou. Não queria que eu me casasse com um forasteiro, tinha medo de me perder. Eu era a única mulher de sua vida, ele dizia, já que minha mãe havia morrido no parto do meu irmão mais novo... — lágrimas escorreram de seus olhos.
Ithan a abraçou e eu deixei esse momento só para eles. Levantei e fiquei olhando pela janela a floresta imponente que por tantas noites visitei.
Jane sentou-se no meu lugar na cama, encostou seu rosto no ombro de Ithan, que a envolveu em seus braços e prosseguiu.
— A obra da rodovia chegou ao fim e seu pai voltaria para a Califórnia, então tomamos a decisão. Eu iria fugir com ele e assim fizemos. Deixamos o passado para trás, parei de me transformar e comecei a envelhecer novamente, mas os espíritos não me deixaram. Às vezes, nos meus sonhos, eles falavam comigo e me mostravam meus filho transfigurados em formas de lobo e eu tinha muito medo. Não queria que meus filhos tivessem a vida que eu tive, por isso tentei fugir do destino que lhes fora traçado. Eu e seu pai combinamos de nunca deixar vocês virem para cá. Não permitiríamos que os genes de lobo fossem ativados.
— Mas então por que a senhora permitiu que eu viesse para cá depois que meu pai morreu? — Ithan acariciou o rosto da mãe enquanto esperava a resposta.
— Foram os espíritos. Eles me disseram que não dava mais para fugir, que seria pior se você se transformasse sozinho, lá na Califórnia, que eu teria que deixar meus filhos seguirem seus destinos, então te deixei partir — Lágrimas novamente rolaram.
— Então a Senhora já sabia que eu me transformaria?
— Filho, talvez você não se lembre, mas quando você era criança, eu te contava sobre as lendas quileutes e você adorava. Até que um dia você me contou que a vovó apareceu para você em um sonho e te mostrou como você seria depois de adulto. Te mostrou como um lobo enorme, vermelho, ao lado de uma loba cinza, cercados por vários outros lobos de cores e tamanhos diferentes. E você era o o mais forte e o maior de todos. Mas eu nunca tinha falado da vovó, então achei que foram os espíritos que a mandaram para falar com você em sonho. Esse era o seu destino que eu tentei adiar, mas percebi que isso era impossível...
— Eu não me lembrava disso... — falou, desviando o olhar até se encontrar com o meu. Nosso destino estava traçado há muito tempo.
Ele me deu um sorriso e eu sorri em retribuição.
— Bem, depois que você veio atrás do seu avô e nós começamos a nos falar novamente, ele me ligava todos os dias, falando sobre você e sobre a bênção de tê-lo por perto. Ele estava ansioso para me rever e conhecer suas irmãs e eu falei para ele sobre o seu destino, então combinamos que a qualquer sintoma, ele me chamaria. Falou também sobre a sua alegria em namorar Leah. Seu velho avô sabia sobre os lobos e sobre ela, mas quis deixar você descobrir tudo sozinho. Acho que foi o melhor. Não quisemos interferir nas suas descobertas.
— Então foi por isso que você veio até nós? — perguntou. Parecia que agora tudo fazia sentido.
— Sim! Seu avô me ligou ontem à noite. Disse que foi ao seu quarto logo após a sua chegada e o encontrou ardendo em febre e delirando, então me ligou imediatamente e eu parti. Cheguei hoje cedo, estacionei o carro e assim que desci, uma brisa quente envolveu meu corpo. Eram os espíritos vindo falar comigo, me disseram que a sua hora havia chegado e que você seria o responsável por ajudar a salvar a tribo dos ataques que estavam por acontecer. Depois de duas guerras, você estaria livre para seguir sua vida humana, meu filho.
Ataques? Não tem nenhum ataque para acontecer. Alice teria nos avisado! Decidi não falar nada e aguardar o desfecho da história.
— Os espíritos também me falaram que em breve suas irmãs se juntarão a você. Elas não podem evitar que a transformação aconteça.
— Não! Elas não! Margareth tem apenas 18 anos e Emma acabou de entrar para a universidade! Não quero isso para elas!
— Meu filho, não podemos evitar isso. É o destino delas! E não se esqueça que eu tinha 15 anos quando me transformei e bem... Emma saiu da universidade logo depois que você partiu. Ela começou a se sentir fora do lugar, um vazio a tomou. Ela percebeu que sua vida não estava completa lá. Eu vim para ficar, como falei e em breve, elas virão também!
— Não quero, não posso aceitar! — levantou, vindo em minha direção. Seus olhos estavam carregados de sofrimento que se derramaram em lágrimas ao me abraçar.
— Meu amor, você não está sozinho. Você tem a mim. Nós somos fortes e iremos vencer tudo e todos para proteger nossa tribo!
— Eu sei, mas não quero envolver minhas irmãs nisso. Elas não precisam abandonar suas vidas para vir para cá.
— Talvez a vida delas deva ser vivida aqui e não lá – abracei meu homem mais forte. — Tudo vai dará certo, meu amor.
— Meu filho, saiba que eu fiz de tudo para evitar isso, mas não tem como, é o nosso dever proteger a tribo — Jane se aproximou.
Ithan soltou seu braço direito e puxou sua mãe para junto de mim, abraçando nós duas.
— Farei de tudo para proteger as mulheres da minha vida. Vocês, Emma e Meg. Serei o lobo mais forte e mais poderoso que já passou por essa região. Darei minha vida para proteger vocês — o abraço ficou mais apertado.
Me senti a mulher mais protegida do mundo nesse momento.