A Magia está a solta

4795 Words
m*l desceu pela janela. — Vamos? — ela chamou Ben já perto da casa na árvore, o garoto desceu lentamente, usando os mesmos ponto que a de cabelo púrpura. Ela revirou os olhos pela demora e quando ele desceu ela apoiou uma das mãos na cintura e negou com a cabeça. — Eu nunca desci por uma janela. — ele disse baixinho, olhando para ela e tomando ar. Ela sorriu maleficamente. Eles chegaram na árvore enorme e cheia de sulcos com uma escada de corda. m*l virou de costas e começou a subir, sendo seguida pelo garoto Auradoniano. A casa da árvore era mais elaborada do que qualquer uma que Benjamin já tinha visto, com pilares em miniatura e uma pequena sacada que dava para a floresta escura abaixo. Chegando lá em cima, Ben olhou à sua volta, boquiaberto. As paredes eram cobertas de prateleiras com provetas, frascos e recipientes com vários líquidos fluorescentes. No canto, havia uma televisão pequena com umas 15 antenas grudadas nela. — O que aconteceu? — m*l perguntou olhando para Evie e Carlos. Carlos apontou para a caixa cheia de fios em que estava trabalhando. — Acho que consegui fazer a bateria funcionar. Quando a luz atravessou a barreira e perfurou o teto, a caixa começou a emitir um som estranho. — E a televisão ganhou vida. Havia tantas cenas diferentes. — Evie disse meio sonhadora. — E cachorros que falam. — Carlos disse meio amedrontado. Mal levantou uma das sobrancelhas. — Mas assim que a tela piscou e apagou de novo, a caixa parou de funcionar. — Evie falou. — Pode fazê-la funcionar de novo, Carlos? Mas que dure por mais tempo? — m*l fitou o filho de Cruela. Ele coçou a cabeça. — Talvez, mas também pode levar alguns dias para tentar consertá-la. — Esse lugar é incrível. Mal tinha se esquecido completamente do príncipe. Por sorte ele estava distraído demais com o laboratório do Carlos para ouvir a conversa do trio. — É meu laboratório de ciências. Tenho que deixar tudo na minha casa da árvore. Tenho medo que minha mãe comece a ter ideias e transforme meus materiais químicos em maquiagem e produtos de cabelos. — Carlos falou enquanto Ben olhava atentamente cada detalhe do lugar. — O que é tudo isso? — perguntou Ben, pegando um frasco com um negócio branco parecido com neve. — Ah, é do acervo de química. É poliacrilato de sódio. Eu tava tentando ver se conseguia usar como esponja quando misturasse com água — disse Carlos. — Tente consertar a caixa, Carlos. — m*l tecnicamente ordenou que o garoto consertasse algo que poderia nunca mais funcionar novamente. — Eu já vou indo. — m*l desceu pelas escadas e saiu do terreno dos De Vil. Ela passou a noite desarrumando o gramado alto dos vizinhos e trocando duendes de jardim, caixas de correio e móveis de lugar. E se divertiu “decorando” as casas com papel higiênico e atirando ovos nos riquixás. Nada como um dano à propriedade alheia para fazê-la um pouco mais feliz. — Você não cansa de fazer maldade? — era a voz do príncipe Benjamin. A garota de cabelo púrpura virou olhando para o garoto, ela andou até ele rindo. — E você, não cansa de me perseguir? — ele não soube o que responder naquele instante. — Eu… — ele não podia negar, era verdade, ele estava sempre indo ao encontro da filha da Malévola. — Está muito tarde, madrugada. Sabia que você não iria voltar de imediato para casa, então… — Você realmente achou que eu, m*l, filha da Malévola, precisasse da sua ajuda? — ela pensou — Aliás, quem são seus pais? — ele engoliu em seco, não sabia se deveria falar, mas o garoto puritano decidiu jogar o jogo dela. — Talvez um dia você descubra. — ele disse com um sorrisinho. Ela ficou incomodada com aquilo. — Quantos dias você irá ficar aqui? — ela perguntou. — Um mês. — foi sua resposta. Ela tinha um mês para se aproximar do principezinho. Ela tinha que descobrir tudo sobre ele, afinal, ela sonhou com ele, um completo desconhecido, agora se ele não tivesse utilidade para ela, era bem provável que ela o entregasse aos vilões, ou talvez não. Foi com surpresa e choque que encontrou sua mãe acordada esperando por ela ao voltar para casa no Castelo de Barganha. — Mãe! — disse m*l, alarmada ao ver Malévola sentada em sua grande cadeira verde, à frente da janela de vidro manchado. Era seu trono, afinal — sua poltrona da Maldade. — Olá, querida — disse Malévola, com a voz gélida — Sabe que horas são, mocinha? Mal estava confusa. Desde quando tinha hora para volta pra casa? Não que sua mãe se importasse onde ela estava ou quando iria voltar — ou será que ela se importava? A mulher não se chamava Malévola por nada. — Duas da manhã. — arriscou m*l. — Achei que sim — disse Malévola, puxando uma de suas mangas roxas para cima e corrigindo a hora em seu relógio de pulso. Ela puxou a manga para baixo e olhou para a filha. Mal esperou, perguntando-se até onde isso iria. Ela já não via a mãe com tanta frequência. Mas seu tom ameaçador continuava o mesmo. — Onde eu estava? Ah, é mesmo. O m*l vive! — disse Malévola em um sussurro. — O m*l vive. Exatamente, mãe — m*l assentiu. — É sobre isso que quer conversar? Sobre o que eu causei na cidade? Bom trabalho, não? — Você entendeu errado, minha querida — disse sua mãe, e foi então que m*l percebeu que Malévola não estava sozinha. Ela estava acariciando um corvo n***o, empoleirado no braço de sua cadeira. O corvo grasnou baixo e voou para o ombro de m*l, bicando sua orelha. — Aí! — gritou ela. — Para com isso! — É só Diablo. Não tenha ciúmes, amiguinho. É a m*l — disse Malévola com desdém. E, mesmo sabendo que sua mãe não se importava com ela (m*l tentava não levar para o lado pessoal, já que Malévola não se importava com ninguém), ainda doía quando ela falava nesses termos em alto e bom som. — Diablo? Esse é o Diablo? — perguntou m*l. Ela sabia tudo sobre Diablo, o primeiro e único amigo de Malévola. Sua mãe havia contado a história várias vezes: há 20 anos Malévola lutou contra o príncipe Philip na forma de um grande e poderoso dragão, mas havia sido derrubada por uma a**a de justiça e paz, que algumas fadas boas e irritantes haviam ajudado a mirar diretamente em seu coração. Malévola acreditou que estava morta e tinha passado desta para a melhor, mas em vez disso acordou no dia seguinte, sozinha e derrotada, naquela ilha terrível. A única coisa que havia sobrado da luta era uma cicatriz em seu peito, onde a espada a atingira, e de vez em quando ela sentia a dor fantasma dessa ferida. Ela disse a m*l várias vezes como, quando acordou, percebeu que aquelas fadinhas miseráveis haviam tirado tudo dela: seu castelo, seu lar e até seu corvo querido. — O grande e único Diablo — disse Malévola, parecendo feliz de verdade finalmente. — Mas como? Ele estava congelado! Elas o transformaram em pedra! — disse m*l. — Sim, elas fizeram mesmo isso, aquelas criaturinhas horrendas. Mas ele voltou! Ele voltou! E o m*l vive! — exclamou Malévola, com uma gargalhada de bruxa… para não perder o hábito. Ok. Sua mãe estava se tornando um pouquinho repetitiva. Mal revirou os olhos, impaciente. Para o resto dos tolos, capangas e idiotas da ilha, Malévola era a coisa mais assustadora do mundo com seus dois chifres. Mas para m*l, que tinha visto sua mãe colocar geléia de duendes na torrada e derrubar migalhas no sofá, polir os chifres com graxa e costurar a barra maltrapilha de sua capa púrpura, ela era apenas sua mãe, e m*l não tinha tanto medo assim dela. Tá, ela tinha medo da mãe, mas não ficava tão assustada quanto Carlos. Malévola se levantou da cadeira e fitou com seus olhos verdes os olhos idênticos da filha. — Meu Olho de Dragão, meu cetro das trevas. Diablo disse que ele finalmente acordou! O m*l vive! E o melhor de tudo: está na ilha! — Seu cetro? Tem certeza? — perguntou m*l em tom cético. — É difícil acreditar que o Rei Fera de Auradon tenha deixado uma a**a tão impressionante na ilha! — Diablo jurou tê-lo visto, não é, meu querido? — disse Malévola. O corvo soltou um grito agudo. — Então onde ele está? — perguntou m*l. — Bem, eu não falo a língua dos corvos, não é? Está em algum lugar deste pedaço gigante de pedra! — Malévola disse, incisiva, jogando a capa para trás. — Certo. Mas e daí? — E daí? O Olho de Dragão está de volta! O m*l vive! Significa que posso conseguir meus poderes de volta! — Não enquanto a barreira estiver ativa — disse m*l, apontando para cima. — Não importa. Achei que aquelas fadas desprezíveis tinham-no destruído, mas apenas o congelaram, assim como fizeram com Diablo. Ele está vivo, por aí, em algum lugar, e o melhor de tudo: você, minha querida, vai encontrá-lo para mim! — Malévola anunciou, retumbante. — Eu? — Sim. Não quer provar seu valor para mim? Provar que é digna de ser minha filha? — perguntou sua mãe, baixinho. Mal não respondeu. — Você sabe que o que você faz não basta. Na sua idade, eu já tinha exércitos de duendes sob o meu comando, mas você… o que você almeja? Ficar pichando pela cidade? Precisa fazer MAIS! — ela subiu o tom, levantando-se da cadeira. Diablo bateu as asas em concordância. Mal tentou não demonstrar seus sentimentos. Ela achava as pichações bem legais. — Está bem! Está bem! Eu vou procurar seu cetro! — concordando, apenas para que sua mãe não ficasse mais irritada. — Maravilha. — Malévola tocou seu coração, ou o buraco em seu peito onde ele deveria estar. — Quando aquela espada atravessou minha couraça de dragão, e caí naquele penhasco há 20 anos, achei que tinha morrido. Só que eles me trouxeram de volta para sofrer um destino pior que a morte, muito pior. Mas um dia terei minha vingança! Mal assentiu. Ela já tinha ouvido dessa ladainha tantas vezes que podia até cantá-la dormindo. Malévola pegou sua mão e, juntas, disseram em coro: “— Vingança contra os tolos que nos aprisionaram nesta ilha amaldiçoada!” Malévola puxou m*l para mais perto para poder sussurrar algo em seu ouvido. — Sim, mãe, lá — respondeu a garota. A Senhora das Trevas sorriu. — Agora prepare-se para trazê-lo de volta, para que possamos nos libertar desta prisão flutuante de uma vez por todas! Mal marchou lentamente para seu quarto. Ela foi até a sacada, de onde podia ver toda a ilha e as torres cintilantes de Auradon brilhando ao longe. Alguns minutos depois, ela ouviu o som de bugigangas tilintando, o que significava que Jay tinha dado uma passada para perturbá-la ou para roubar seu lanche da madrugada. — Estou aqui — disse ela. — Você sumiu quando a diversão começou — disse ele, falando da festa. — Tinha que ter visto a galera correndo histericamente quando Cruela apareceu. — ele escalou até a sacada onde ela estava, com um saco de salgadinhos de queijo fedorento na mão. Ela deu de ombros. — Qual é a daquele corvo? — perguntou ele, mastigando alto a guloseima conforme seus dedos ficaram laranjas. — É o Diablo. Sabe, o antigo bicho de estimação da minha mãe. Ele voltou. Jay parou de mastigar. — Ele o quê? — Ele voltou. Descongelou. Agora minha mãe acha que o feitiço da Ilha pode estar diminuindo de alguma forma. Jay arregalou os olhos. m*l se virou e continuou. — Não é só isso. Diablo jura que viu o cetro brilhar de novo, com vida. Sabe, o cetro dela, a melhor a**a, aquela que controla as forças obscuras do m*l, blá, blá, blá. Ela quer que eu o encontre e que o use para quebrar a maldição desta ilha. Jay soltou uma gargalhada. — Bem, parece que sua mãe, depois que voltou a falar com o passarinho, perdeu o rumo de casa, hein? Aquele cetro está escondido para todo o sempre, sempre, sempre… — E sempre? — disse m*l com um sorrisinho. — Exatamente. Mal se virou, tentando mudar de assunto. — Você já imaginou como é a vida por lá? — perguntou ela, indicando Auradon. Jay respondeu com escárnio. — Sim, deve ser h******l. Ensolarado, e feliz, e… terrível. Eu agradeço às estrelas todos os dias por não estar lá. — É, eu sei. Mas, quer dizer… você não se cansa deste lugar, tipo… pra variar? — continuou ela, pensativa. Jay lançou um olhar desconfiado para ela. — Deixe pra lá — m*l achou que ele não entenderia. E continuou observando a noite. Jay seguia mastigando o salgadinho de queijo e brincando com suas jóias recém roubadas. Uma lembrança voltou à mente de m*l. Ela tinha 5 anos e estava no mercado com sua mãe, quando um duende tropeçou e caiu, derrubando frutas da cesta dele por todo o lugar. Sem pensar, ela começou a pegar as frutas, ajudando o duende a recolhê-las. Uma por uma, ela pegou as maçãs, limpou-as em seu vestido e as colocou de volta na cesta. De repente, m*l olhou para cima de onde estava agachada. O mercado inteiro ficou em silêncio e todo mundo, incluindo sua mãe, vermelha e fumegante, olhavam para ela. — Levante-se já — murmurou sua mãe. Malévola chutou a cesta, e as maçãs caíram de novo. A menina obedeceu. Quando voltaram para casa, sua mãe a trancou no quarto para pensar no que tinha feito. — Se não tomar cuidado, minha querida, vai acabar como ele — como seu pai — , fraca e sem poder. E PATÉTICA! — Malévola uivou do outro lado da porta. A pequena m*l olhou no espelho velho pendurado de forma precária em seu quarto. Lutando contra as lágrimas, ela jurou nunca mais desapontar sua mãe. — Temos que encontrá-lo — disse m*l para Jay. Um vento gelado soprava do mar abaixo, fazendo-a voltar para a realidade. — O Olho de Dragão está aqui. — m*l, não é poss… — A gente tem que fazer isso — insistiu m*l. — Ok — respondeu Jay, encolhendo os ombros, virando-se para partir. — Vamos ver. Mal olhou pela última vez para o horizonte, observando o brilho das luzes à distância. Ela sentiu uma fisgada no peito, quase uma esperança. De quê, ela não sabia. Jay foi embora do Castelo da Barganha. Já era quase de manhã. Ainda estava escuro, mas dava para ver e ouvir vultos circulando pela ilha. Ele sentiu um calafrio. Seguindo seu caminho pelas ruelas sombrias da cidade, passando pelas árvores sem folhas e edifícios de fachadas carcomidas, abandonados e sem esperança, assim como as pessoas que lá viviam. Jay apertou o passo. Ele não tinha medo do escuro. Na verdade, dependia dele. O garoto fazia melhor seu trabalho à noite. Mas ele nunca iria se acostumar com a aparência da ilha na escuridão. Jay trabalhava enquanto todos estavam dormindo e podia ver o mundo ao seu redor com clareza, como ele realmente era. Ele sabia que a ilha e a cidade e as árvores sem folhas e a fachadas arruinadas eram sua vida: não importava o que seu pai e outros vilões tinham vivido. Aqui não havia glória. Nem mágica, nem poder. Era só isso — tudo que eles poderiam ter, ser ou conhecer. Não importa o que m*l pense. Jay chutou uma pedra que tinha despencado de um dos prédios decrépitos e um gato irritado miou para ele das sombras. Ela se acha. Mal jamais admitiria sua derrota, especialmente com aquele mau humor. Ela era tão teimosa. Praticamente delirante. Em momentos como aquele, Jay percebia claramente os efeitos de a amiga ter sido criada por uma vilã maníaca. Ele não culpava m*l por não querer contestar a mãe. Afinal, ninguém ousaria, mas não havia a menor possibilidade de o cetro de Malévola estar na Ilha dos Perdidos. Mesmo se estivesse, Jay e m*l nunca o encontrariam. Jay balançou a cabeça. Olho de Dragão? Tá mais pro Olho de Desespero. Aquele corvo é maluco, quem sabe por ter ficado literalmente petrificado durante 20 anos. Deu de ombros e virou na esquina da rua onde morava. Ele tentou esquecer, esperando (e torcendo) para que m*l fizesse o mesmo. Ela tinha seus caprichos, mas eles nunca duravam muito tempo. Essa era a melhor característica de m*l. Ela ficava agitada com alguma coisa, e no dia seguinte nem se lembrava mais. E eles se davam bem apenas porque Jay havia aprendido a lidar com ela. Quando finalmente solucionou o último quebra-cabeça dos cadeados, correntes e fechaduras roubadas que protegiam sua casa (os ladrões eram os mais paranóicos em r*****o a, bem, ladrões), ele empurrou a barulhenta porta de madeira podre e entrou. Um pé de cada vez. Passe o peso do corpo a cada passo. Fique próximo da parede… — Jay? É você? Caramba. Seu pai ainda estava acordado, cozinhando ovos, com seu fiel papagaio Iago no ombro. Será que Jafar estava preocupado por seu filho ter passado passado a noite fora de casa? Estaria ele intrigado para saber onde ele andou, ou com quem, ou porquê ainda não tinha chegado? Até parece. Seu pai só tinha um pensamento em sua mente, e Jay sabia exatamente o que era. — Qual foi a bolada da noite? — perguntou Jafar com avidez enquanto colocava seu prato em cima da mesa, perto de uma pilha de moedas que serviam como dinheiro na ilha. A mesa era onde Jafar praticava sua atividade favorita: contar seu dinheiro. Havia uma pirâmide de moedas enorme sobre a mesa, mas Jay sabia que não era o suficiente para satisfazê-lo. Nada era. — Belo pijama. — disse Jay, caçoando. O truque com seu pai era continuar se movendo, ficar de pé e, acima de tudo, evitar responder a pergunta, pois nenhuma resposta estava certa. Quando não se podia vencer era melhor nem jogar. Senão era desastre garantido. Cara, o melhor amigo do seu pai era um papagaio. Precisa dizer mais alguma coisa? — Belo pijama! — tagarelou Iago. — Belo pijama. Jafar estava usando um roupão gasto sobre seu pijama estampado com pequenas lâmpadas. Se 20 anos tinham deixado um corvo congelado maluco, 20 anos de vida na Ilha dos Perdidos haviam destruído a fama do antigo Grão-Vizir de Agrabah, junto com sua grandiosidade e pompa (pelo menos, a pompa que seu pai achava que tinha). As suntuosas vestimentas de seda e veludo tinham dado lugar a uma maltrapilha calça desgastada e a uma camisa com manchas de suor impregnada com o cheiro forte de sua loja, estrategicamente localizada em frente aos estábulos. A barba n***a e lustrosa agora era grisalha e cheia de falhas. Havia ainda a barriga saliente, claro. Iago passou a chamá-lo de “sultão”, afinal Jafar agora se assemelhava ao antigo adversário em tamanho. Todavia, para ser justo, é preciso ressaltar que o próprio Iago parecia acabado: lembrava alguém que tinha chegado agora mesmo de uma noite inteira de farra. Em troca, Jafar chamava seu colega emplumado de nomes que ele não conseguia repetir de jeito nenhum, mesmo sendo um papagaio. Jay odiava o pijama de seu pai. A roupa era um sinal do quanto eram decadentes. A flanela estava tão gasta em alguns lugares que dava para ver os pneuzinhos da barriga de Jafar sob o tecido. Jay tentava não olhar, nem mesmo agora sob a luz mínima da madrugada. Seu pai ignorou as piadinhas sobre o pijama. Já tinha ouvido tudo isso antes. Ele saboreou seu lanche sem oferecer nenhuma mordida para Jay. — Vamos lá, anda logo. Qual o butim? Deixe-me ver. Jay olhou para o tapete enrolado no canto da sala, atrás da mesa, e bocejou. Inutilmente. Eles sabia que não havia jeito de fugir de seu pai agora. Esvaziou os bolsos, relutante. — Um sapatinho de cristal quebrado. Peguei da Madame Tremaine. Com um pouco de cola, dá pra conseguir um bom preço. — O sapato quebrado de salto baixo espatifou-se no momento em que bateu na mesa. Jafar ergueu uma sobrancelha. — Tá… supercola? Jay continuou. — Uma das coleiras de Lúcifer, o chaveiro de p*****a de Rick Ratcliffe… e veja: um olho de vidro de verdade! — estava coberto de restos de algodão. — Só está um pouco usado. Peguei de um dos piratas. — ele o levantou na altura do próprio olho e deu uma mirada, mas logo afastou, abanando o nariz com a mão. — Por que os piratas nunca tomam banho? Prazer, meu nome é chuveiro. Eles nem estão mais em alto-mar! — o garoto rolou o olho pela mesa em direção ao seu pai. Iago emitiu um som curioso. De sua parte, Jay esperava o inevitável. Jafar mexeu de leve nos itens e suspirou. — Lixo. — Mas é só isso que tem nesta ilha — argumentou Jay, se apoiando na pia da cozinha. — Esta é a Ilha dos Perdidos, a Ilha dos Restos, lembra? Seu pai lhe dirigiu um olhar severo. — Você foi até a casa dos De Vil e não pegou nem um casaco de pele? O que fez a noite toda? Ficou babando na filhinha da Malévola? Jay revirou os olhos. — Pela milésima vez, não. E Cruela voltou antes do esperado. — assim que disse isso, ele se perguntou por que não tinha pensado nisso antes. — Troféu! — disse Iago, cuspindo as migalhas do biscoito. — Grande troféu. Jay suspirou. O grande troféu. Era o sonho de seu pai: que um dia seu único filho encontrasse um carregamento tão grande de ouro que Jafar nunca mais precisaria cuidar da loja de tranqueiras. O fato de a Ilha dos Perdidos ser um monte de lixo flutuante não importaria mais. De alguma forma, Jafar acreditava que o grande troféu estava logo ali na esquina, com uma recompensa que o recolocaria em seu justo lugar de feiticeiro, com todo o poder e a pompa decorrentes disso. Que ilusão. Mesmo que um tesouro assim existisse, será que ele poderia levá-los de volta aos bons tempos, ou libertá-los da prisão? Como se um objeto ou uma joia ou moedas de ouro pudessem desfazer todo o estrago que pessoas como Jafar haviam feito, levando ao desterro e a criação daquele lugar. O grande troféu. Seu pai era tão louco quanto m*l havia sido naquela noite. Jay fez que não com que cabeça. De repente, ficou estático. Ideia! Espera aí. O que m*l dissera naquela noite mesmo? Que o corvo achava que o cetro mágico de Malévola, o Olho de Dragão, estava escondido em algum lugar na ilha. Se ele estivesse dizendo a verdade, e se Jay pudesse encontrá-lo, seria o maior prêmio do ano. Do século!, ele pensou. Seria possível? Seria assim tão fácil? Será que seu pai estava certo ao se prender a uma última esperança por algo melhor depois de todos esses anos? Não. Jay esfregou os olhos. Tinha sido uma noite longa. Não era possível que aquela coisa estivesse na Ilha dos Perdidos. Não havia nada poderoso por lá, nem pessoas, nem coisas. E, mesmo que estivesse por aqui, por mais improvável que fosse, a barreira sobre a ilha mantinha toda a magia fora. O Olho de Dragão era só um nome bonito para uma bengala. Como ele havia dito a m*l, era um esforço inútil. Era melhor que tentassem se infiltrar em um dos navios do Porto dos Duendes que ia para Auradon — não que eles quisessem morar lá! Talvez a gente pertença à Ilha dos Perdidos, dos Restos, da Esquecidos. Talvez seja assim que a história deva ser. Mas quem vai contar a novidade para o meu pai? Jay observou enquanto seu pai voltava sua atenção à pilha de moedas. Contá-las o deixava calmo de um jeito que seu filho jamais entenderia. Jafar estava assobiando e olhou para cima quando percebeu que Jay o observava. — Você conhece a Regra de Ouro? — disse seu pai enquanto acariciava o dinheiro. — Com certeza. Boa noite, pai — disse Jay, dirigindo-se ao tapete gasto embaixo das prateleiras nos fundos, onde ele dormia. Quem tem o ouro dita as regras. Era nisso que seu pai acreditava e, embora Jay nunca tivesse visto ouro em toda sua vida, ele fora ensinado a acreditar nisso também. Ele só não sabia se havia ouro para ser encontrado. Não na Ilha dos Perdidos. Ainda assim, conforme se acomodava no tapete duro que lhe servia de cama, ele tentou imaginar como seria achar algo de tanto valor. O Grande Troféu. Ele dormiu, e sonhou com seu pai transbordando de orgulho em um pijama feito de ouro. Carlos passou a madrugada arrumando o Salão do Inferno. As pessoas da ilha diziam para ele que a mãe havia ficado mais mansa com a idade, que ela estava mais racional e menos escandalosa — mas não eram eles que moravam com ela. Cruela o mataria se soubesse que alguém chegou perto de seu closet de peles — aliás, dentro dele — e, mais ainda, que essa pessoa tinha se enroscado no meio de uma pilha de casacos de pele classe A… bem, basta dizer que não era o couro de um cachorrinho que ela arrancaria… A luz brilhante da manhã fazia tudo parecer mais triste e sórdido. Alguém tinha quebrado o balanço, de forma que ele pendia suavemente, roçando no chão. Carlos estava com a voz embargada de sono. Ele estava faminto, sua cabeça doía. Ele não tinha dormido nada, teve que ouvir os gritos histéricos da mãe e pensava a todo momento na luz disparada de sua máquina e que tinha atravessado a barreira. Aquilo aconteceu mesmo? Por um momento, Carlos pensou ter sentido alguma coisa no ar. Algo selvagem, elétrico e explodindo de energia. Magia? Será? Ele se perguntou se conseguiria que a máquina fizesse aquilo de novo. Depois do café da manhã. O garoto limpou muita coisa. Mas ele era Carlos de Vil, o garoto gênio, certo? Encontrou um jeito de tornar essa tarefa mais fácil. Na cozinha, muito antes de Carlos arrumar, parecia que uma bomba tinha explodido. Todos os balcões e superfícies estavam grudentos e cheios de copos, tigelas, pipoca e batatinha, ovo podre, cachorros-quentes pela metade e garrafa vazias de sidra. Seu pé chegou a grudar no chão, fazendo um barulho que parecia meio velcro, meio gosma. Com a cozinha já limpa, o filho de Cruela encheu uma tigela de cereal congelado e encaroçado e pegou uma colher e, nesse momento, Allison apareceu. Ele ainda descobriria como ela consegue entrar onde deseja sem ser notada. — Desculpe por não ter ficado e te ajudado. Acabei indo embora com Harry. — ela disse se apoiando no balcão. — Tudo bem — o garoto falou antes de levar a colher cheia de cereal à boca. Ele sabia que Allison tinha uma queda por Harry. — Conseguiu terminar de limpar tudo? — a garota perguntou ao ver o rosto cansado do rapaz. Ele balançou a cabeça confirmando. Assim que acabou com o cereal, levou o pote até a pia e pegou sua mochila. Juntos foram para a escola. Nenhum dos dois ousou comentar sobre o quando Cruela havia atormentado o filho. Enquanto isso. Antes de sair para ir à escola. Benjamin estava sentado na cadeira em frente a mesa de escritório. O bloco de notas que seu pai lhe deu para anotar sobre os filhos dos vilões estava em branco, ele deslizava uma das mãos em seu cabelo castanho-mel. Ele não sabia se anotava o acontecimento com a bateria de Carlos. O filho de Cruela era um gênio por natureza, mas apesar disso tudo, o herdeiro do trono não queria prejudicar de um certo modo a filha da Malévola e, ele sentia que ainda tinha muito a descobrir sobre os filhos daqueles ditos vilões. Mas não para o seu pai. É claro, não mesmo. Ele sentia algo por ela, um sentimento começado por um sonho, um d****o imenso de descobrir quem era a garota dos olhos verdes intensos. Agora ele estava vivenciando o seu sonho. Com o rosto encostado na palma da mão e o cotovelo apoiado na mesa, ele foi escrevendo sem pensar. M aravilhosa A dmiravelmente L inda — m*l… — o nome da filha da senhora de todo o m*l foi falado pelo filho da Bela e da Fera antes de sair de seu castelo da ilha, tendo como destino Dragon Hall.
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