Ícaro – parecendo bem mais humilde agora – cumprimentou os três e puxou uma cadeira para se sentar com eles.
— Você deveria ter me dito – foi o que ele falou, virado para Lara. Lucius então entendeu que esse era o Socorrista do qual elas estavam falando. Dava para ver que a ficha havia caído para ele.
— Você é sempre assim, prepotente? – Lara perguntou, sem olhar nos olhos dele, mexendo com uma colher o seu café, fingindo que não se importava com ele. – Como estávamos dizendo, Lucius, que interessante nós dois sermos advogados, não é? Eu e você, e que incrível que você seja o filho da senhora Mirtes.
Ela estava de novo sendo rebelde e só após jogar isso no ar, ela olhou para Ícaro, imaginando que isso quebraria um pouco a crista dele.
— Você é o filho da senhora Mirtes, a que trouxemos hoje desmaiada e sozinha para o hospital? – E ali estava, ele tinha encontrado outra pessoa para despejar o seu veneno, sem ao menos se desculpar com Lara.
— Ei, alto lá, rapaz – Nadja vendo que a situação poderia piorar, o caldo entornar, resolveu entrar na conversa. – Primeiro que ela não estava desmaiada quando a encontraram, Lara já havia acudido-a, e segundo que estávamos falando com Lucios, que nos disse que a mãe tem Alzheimer e ele apenas entrou no banheiro por uns minutos e ela saiu, sem que ele visse. Estávamos até arrumando alternativas aqui de como ela pode fazer para que não ocorra mais isso. Então, guarde suas arma, a assistente social aqui sou eu.
Ela estava nervosa, a hierarquia foi delimitada e Ícaro finalmente baixou a guarda e relaxou os ombros.
— Não sou prepotente…
— Não quero mais falar com você, Socorrista. Você é uma pessoa muito volátil, sugiro procurar ajuda. Nem sei como consegue permanecer no seu cargo, sendo agressivo com as pessoas. Jamais iria gostar que me socorresse um dia.
Ela viu quando ele empalideceu, mas Lara não estava satisfeita, continuou:
— Foi um prazer falar com vocês, conhecê-los – disse, virando-se para Lucius e Nadja. – Estimo as melhoras de sua mãe, e fique com um cartão meu para me dar notícias dela, por favor.
Ela havia se esquecido que não estava com sua bolsa, apenas com o celular.
— Bem, anotem meu número, estou sem bolsa. Fui arrastada para cá, sem chance de atravessar a rua e pegar minha bolsa – ela cutucou Ícaro, que tinha ficado de pé quando viu que ela ia embora. Lara disse o número e Nadja e Lucius anotaram em seus celulares. Ela então saiu, procurando no celular um contato de táxi. Entrou no elevador, ainda olhando para os contatos do celular e viu que Ícaro estava ao seu lado.
— O que você quer? – Ela perguntou, sem olhar para ele.
— Me desculpar com você.
— Agora? Um pouco tarde para isso, não acha?
Saiam do elevador e atravessaram o saguão do hospital com Ícaro ainda andando ao lado dela e, puxa, como ele era alto.
— Está desculpado, está bem? Nadja me explicou que você está sob pressão e tudo mais, até o entendo e o admiro por se preocupar com seus pacientes. Se todos os profissionais agissem assim, certamente nossos idosos e nossas crianças estariam mais protegidas.
Lara falava com ele sem parar de andar. Com o celular ao ouvido, depois de conseguir o contato de um táxi, ela parou de frente ao hospital, esperando a ligação ser completada.
— Me deixe levá-la ao seu trabalho?
— Oi? – Ela achou que tinha ouvido errado e desligou o celular. – Não está trabalhando?
Ela apontou o uniforme dele.
— Peguei uns dias de gancho, depois de tê-la tratado tão m*l – ele falou baixo.
— Não devia, mas sinto muito.
— Foi até uma punição leve, Nadja é maravilhosa e compreensiva.
Lara ficou olhando para ele e quase tinha que levantar o pescoço, ele devia ser mais de uma cabeça maior que ela.
— Posso tentar consertar meu erro, levando-a ao seu trabalho?
— Em uma ambulância? – Ela zoava, mais amigável com ele.
— Meu carro está no estacionamento do hospital.
Ele sorriu. Misericórdia, que sorriso maravilhoso. O furinho no queixo ficou mais acentuado com o sorriso, e sorrindo, ele parecia ser outra pessoa, ainda mais lindo, se é que isso era possível.
— Terá que fazer mais do que isso para ser perdoado por mim, mas vamos lá, o taxista não está me respondendo mesmo.
— Estou aberto a opções, é só pedir e serei seu escravo.
Pareceu à ela que ele estava… flertando com ela?
Lara o acompanhou até o estacionamento, lado a lado, sentiu o coração disparar e um aquecer no rosto, esperava que ele não visse.
— Por enquanto a carona está ótima. Depois verei meios de o fazer pagar por sua insolência, Ícaro, não tenha dúvidas – ela cutucou-o mais uma vez. Não ia deixá-lo ficar com a última palavra.
Como era possível que o barulho do coturno dele batendo nos paralelepípedos do estacionamento, pudesse excitá-la? Realmente ela não estava bem. Precisava t*****r urgentemente. Ou procurar um médico para medir seus hormônios que deviam estar descontrolados.
O carro dele era esportivo e enorme. Para um homem alto, nada melhor do que um carro espaçoso, ela pensou.
— Bonito carro – ela falou, após ele destravar o alarme e entrarem. Ela colocava o cinto, mas viu que ele a olhava e não ligava o carro.
— O que foi?
— Gostei de como meu nome soou em sua boca.
Porra. Agora ela sentiu um comichão nas partes baixas. Aquele sorriso enviesado a deixou quente. Lara não sustentou o olhar dele, por medo de ele perceber que seu rosto estava quente.
— Ah, pensei que tivesse visto mais um velhinho abandonado – ela disse e olhou para a frente. Mas sentiu seus órgãos se liquefazerem ao ouvir a gargalhada que ele soltou.
— Touchê. Você é boa.
Claro que ele quis dizer sobre ela ser boa em rebater seus comentários, mas ela pensou: você não imagina o quanto, meu caro.
Lara não era aficionada por carros, mas ficou impressionada por aquele, parecia uma nave espacial, cheio de botões e luzes.
Chegaram à frente do trabalho dela em silêncio. Cada um com seus pensamentos e Lara desceu do carro, com um simples obrigada, batendo a porta em seguida.