O soco que ele tentou dar em Jean tocou o ar, pois ele foi rápido em desviar. Guilherme tentou mais uma vez, e acabou ganhando um golpe que fez sua boca sangrar. Com as costas da mão ele limpou o sangue e partiu para o ataque contra Jean, que dessa vez, levou um soco certeiro no olho. Céus, eles iam se m***r.
- Parem com isso, por favor. - Pedi, em vão. Eles continuavam brigando, e não havia ninguém na rua a quem eu pudesse recorrer.
Eu não saberia dizer se eu era mais burra ou corajosa, pois no momento que Jean se levantou, pronto para o ataque, de um golpe que Guilherme havia lhe dado, eu entrei na frente, protegendo meu ex.
Jean já estava com os punhos cerrados, mas parou quando me viu. Ele baixou a mão, e me olhou como se não acreditasse que eu o defendia.
- Jean, por favor, pare. Vá para casa, conversamos depois.
- Não acredito que está fazendo isso. Depois de tudo que esse cara te fez. - Ele disse, dando um passo em minha direção.
- Isso é problema meu não quero te envolver nisso, Jean. Por favor, agora vá. - Eu quase supliquei.
- Fique longe dela. - Gritou Guilherme, e Jean ia partir para a briga novamente.
- Jean, não! Chega os dois.
Eu estava no meio do fogo cruzado. Não queria que nenhum dos dois se machucasse, embora Guilherme merecesse cada soco que levou.
Entramos em casa e fui buscar gelo para ele. Realmente, estava bem r**m a situação. Peguei também, algodão e soro para limpar o sangue dos ferimentos na testa e na boca.
Mas o que eu estava fazendo? Eu devia ir lá e terminar o que Jean começou, mas simplesmente eu só conseguia me preocupar com ele.
- Você não pode estar dormindo com ele. - Disse Guilherme, quando comecei a limpar o ferimento dele, e como sempre, fazendo suas suposições constrangedoras.
- Ah, por Deus! Claro que não. E se estivesse não seria da sua conta. - Eu estava dando explicações e agora eu mesma não me reconhecia.
- Yvi, eu te imploro, você precisa me ouvir.
- E para quê? Para ouvir mais mentiras? Poupe meus ouvidos. Aliás, acho melhor você ir embora, não temos mais nada para falar. - Contestei me levantando do sofá e indo em direção a porta, para abri-la e colocá-lo para fora, mas parei quando ele começou a falar.
- É sempre assim, não é mesmo? Todas as vezes que tento conversar, você simplesmente foge. - Ele começou, e definitivamente, não havia indícios de ter bebido álcool naquela noite.
- Do que está falando agora? - Perguntei confusa com o que ele estava tentando dizer.
- De nós. Ou será que existiu "nós" para você? Tudo o que é importante para você, está naquela maldita revista. Ela sempre está em primeiro lugar na sua vida. - Ele explodiu.
- Não é verdade! - Tentei me defender, mas em vão.
- Sim, essa é a verdade. Eu sempre estive ao seu lado Yvi, apoiei sua carreira. Passei meses e semanas longe de você. Tudo para que você se sentisse feliz e realizada. Mas tudo o que você fez, foi me deixar em último lugar na sua vida. - Suas palavras, me machucavam o mais profundo que elas conseguiam alcançar.
- Aonde quer chegar com tudo isso? - Perguntei, sem querer realmente por uma resposta.
- Por acaso você sabe há quanto tempo não fazemos amor? Estou certo que não, mas eu contei, e são seis meses.
Eu não tinha argumentos para me defender. Ele tinha razão, em partes.
- Mas que d***a! Você é minha mulher.
- Eu era sua mulher. Espera agora você me culpa pela sua traição? - Era isso mesmo? Ele estava me culpando pela traição dele?
- Não estou te culpando. Eu errei, confesso. Mas você não se importou com o que eu sentia. Diga-me, algum dia você se importou comigo? - Havia lágrimas nos olhos dele. Nunca o tinha visto chorar. O Guilherme forte que eu conheci, não existia mais, dando lugar a um homem triste e vulnerável.
- Você sabe que sim, não seja i****a.
- Então porque eu sempre tive a impressão de estar nessa relação sozinho?
- Você está confundindo as coisas, Guilherme. Você quer achar motivos para o que fez, apontando os meus defeitos.
- d***a Yvi! - Ele se levantou vindo em minha direção. - Eu te amei desde o primeiro instante em que eu te vi. Eu quis você, eu te desejei. Eu te entreguei minha vida. Fiz tudo que estava ao meu alcance para te fazer feliz e faria tudo de novo. Eu errei, mas você também errou. Você me deixou de lado. Diga-me qual homem suporta o desprezo de sua própria mulher? Diga-me qual homem consegue ver sua mulher se dedicar mais ao trabalho do que ao marido? E quanto aos filhos que planejamos ter?
Era verdade que eu estava com muita raiva pelo que ele me fez, mas ouvir o quanto eu tinha magoado o homem que eu amava, me deixou com o coração dilacerado. Tínhamos feito muitos planos, mas passei por cima da maioria deles por causa da minha carreira.
Não contive as lágrimas, que eu impedia que caíssem, até aquele momento.
- Chega! Não quero ouvir mais nada. - Gritei tapando os ouvidos.
- A verdade machuca, não é mesmo?
- Verdade? - Eu disse em tom irônico, em meio às lágrimas. - A verdade é uma só. Você me traiu, e isso sim machuca. E quer saber, eu não te odeio. Eu odeio à mim. Eu me odeio porque apesar de tudo, eu não consigo te odiar.
- Yvi, me perdoe. - Guilherme disse se aproximando de mim.
- Não! - Eu disse colocando a mão à minha frente. - Não se aproxime de mim.
- Yvi...
- Saia daqui, eu não quero ouvir mais nada. - Ele parou, mas não retrocedeu.
- Sai! - Gritei, e ele passou a mão nos cabelos negros e foi em direção a porta.
- Eu não vou desistir. - E saiu batendo a porta.
Escorreguei pela parede e abracei os joelhos. A dor invisível que eu sentia, consumia o mais profundo do meu ser.
Me lembrei de quando nos conhecemos. Eu tinha quatorze anos e ele vinte e seis.
Para mim, não foi amor à primeira vista. Nessa época, eu vivia a confusão de ser adolescente, e ter uma mãe super-rígida. Meu pai nem tanto, mas a D. Helen, valia pelos dois.
Guilherme pegou meu telefone com Clarice, que se tornou nosso cupido, e me ligou marcando de nos encontrarmos num dia da semana. Foi a primeira vez que matei aula. Depois disso, meus finais de semana na casa de Clarice, foram trocados por idas ao parque para ficarmos juntos.
Passamos seis meses namorando escondido, até ele insistir em fazer a coisa certa, como dizia me pedir oficialmente em namoro para meus pais.
Minha mãe o bombardeou com perguntas, do tipo de onde ele vinha se tinha irmãos, onde morava, quem eram seus pais, e mais um monte de outras perguntas exaustivas.
Ele foi bem objetivo em responder todas elas de uma vez só.
- “Eu cresci num orfanato, Sra. Helen. Fui abandonado com apenas três dias de vida. Atualmente eu trabalho como assistente de publicidade na Clarkson's Publicity, e moro sozinho, num apartamento no centro. Eu gostaria da sua permissão e do seu esposo, para namorar sua filha."
Isso deixou minha mãe de boca aberta. Otávio, meu pai, apenas olhou por cima dos óculos, sem dar opinião alguma.
- Bem, se eu não deixar vocês vão fazer escondido. Então que assim seja. Podem namorar.”
O descaso dela me incomodava. Mas o pior era que ela não concordava.
Foi complicado no início, porém dois anos depois estávamos casados. E eu estava feliz. A cada dia que passava ao lado dele, eu o admirava mais, e sentia orgulho de ser sua mulher.
Sei o quanto eu o magoei, mas não sei quando deixei que nosso casamento se afundasse, a ponto de perdê-lo para outra mulher. Sei também que minha ausência na vida dele, nunca e em hipótese alguma justificava em partes, sua traição.
Eu o deixei aos poucos, e não percebi. Não poderia voltar e fazer diferente se pudesse eu faria.
Agora, era tarde demais...