Responsabilidades e preocupações.

1863 Words
Agatha Passei o trajeto todo refletindo sobre a conversa bizarra que eu tinha tido com o Dr. Ricardo. Que pergunta estranha foi aquela? Invasiva e de cunho s****l? Por Deus! Eu juro que nunca mais quero ter um papo como aquele de novo. Fiquei tão constrangida que até perdi o rumo. E estou quase me esquecendo de passar na oficina. Puxei a cordinha de parada do ônibus, me levantando apressada. Quase me esqueço que preciso passar na oficina antes de ir para casa. Desço na esquina da oficina e sigo caminhando até lá. O local está cheio de homens, e todos me encaram quando eu entro. Ignoro e vou direto tratar com o mecânico responsável pelo concerto da minha moto. Ele me vê e sorri largo, espero que ele tenha tido a bondade de consertar minha moto. ― Oi! E aí, Agatha? Veio finalmente buscar sua moto? - pergunta. ― Oi, Gui. Vim sim, eu arrumei um emprego graças a Deus. Agora eu posso pagar pelo conserto. Você consertou ela? - pergunto com esperança. ― É claro! Ela está pronta. Eu te falei que eu consertava e depois você me pagava quando pudesse, não falei? Mas você não quis. - deu de ombros. ― Sim, você falou. Mas eu não quis mesmo. Ninguém merece trabalhar de graça, não é? Guilherme estava na casa dos 30 anos, era alto, bonito e sorridente. É Secretamente a fim de mim, ou não tão secretamente assim, pois eu sempre percebo suas investidas, mesmo que sutis e disfarçadas de gentilezas. Ele é uma boa pessoa, é tudo o que eu sei. ― Não seria nada demais, deixe de ser boba. Quer vê-la? ― Sim! É claro. Estou morrendo de saudade do meu xodó. - me animo. ― Vem, ela está lá atrás. - diz rindo. Minha moto estava em um canto, consertada. Meu coração se alegrou, corri até ela e a abracei. ― Ficou top! Eu garanto. - diz Gui. ― Ah, minha linda! Você vai voltar para a mamãe, meu amor. - Gui ri. - Obrigada, por consertá-la sem ao menos saber quando eu poderia vir buscá-la. ― Imagina, não foi nada demais. - ele fica sem graça e começa a esfregar a mão por trás do pescoço. ― É claro que foi. Eu vou passar o cartão, tá? ― Como você quiser, gata. ... Voltei para casa pilotando a minha moto, há quanto tempo eu não sentia o vento no meu rosto, essa sensação de liberdade que só pilotar uma moto proporciona. Deixei ela na garagem do prédio e subi para o meu apartamento. Só de pensar que não vou mais precisar ir de ônibus, já me deixa feliz. Entro em casa e ela está do mesmo jeito que estava ontem: bagunçada. Eu só tenho tempo aos finais de semana, Hugo mesmo ficando em casa todos os dias, nunca levanta uma palha. E aliás, ele nem chegou ainda. Me pergunto que entrevista é essa, que dura o dia inteiro. No entanto, não posso ficar me preocupando com isso. Tomo um banho rápido para ir para a faculdade, pois já são 18h30, caso contrário irei me atrasar. Saio do banho, me arrumo e Hugo ainda não chegou. Suspiro frustrada. "Porque ele é assim?", penso. Pego minha mochila e capacete e desço para a garagem. Ainda bem que minha moto está de volta, pronta para fazer todos os corres. Chego na faculdade com tempo de sobra para ir até a cantina e comer alguma coisa. Estou morta de fome. Chegando lá, encontro com Raissa que vem correndo em minha direção: ― Oi sumida. - diz. ― Sumida eu? É você quem mais falta do que vem na aula, doida! Vou até a uma mesa e ela me acompanha. ― Eu só faço uso da quantidade de faltas que eu posso ter. - dá de ombros. ― Eu sei, mas você acaba perdendo muito conteúdo importante por causa disso. ― Mudando de assunto... ― Só um minuto, Ra. Preciso comprar algo para comer, antes do início das aulas. Espere aí. - me levanto e vou até o balcão. ― Um suco de laranja, um sanduíche natural e um brigadeiro, por favor. - peço. ― Aqui. - a moça me entrega o meu lanche. E novamente, eu passo o cartão de crédito. Onde vou parar? Desse jeito não vai sobrar nada do meu salário do mês que vem. Só o conserto da moto ficou em quase R$ 500,00. Essas coisinhas que comprei para comer, ficaram em R$15,00. Preciso economizar, não posso ficar comendo aqui todos os dias, a comida da faculdade é muito cara. ― Voltei. ― Então, como eu ia dizendo, você conseguiu o emprego? O estágio que você tinha me falado? - lembro de ter comentado com a Raissa que eu estava na luta atrás de um estágio. ― Sim, graças a Deus. Se não, como acha que eu teria pagado por isso aqui? - digo, indicando as coisas que tinha comprado para comer. Ela ri. ― É complicado, né amiga. Se meus pais não me ajudassem, eu nem sei. O dinheiro do estágio não dá para muita coisa. - Raissa faz estágio no Ministério Público do Rio. ― Nem me fale. Eu passei por tempos difíceis nas últimas semanas. Só para você ter uma noção, minha moto estava parada no conserto há quase um mês, e só hoje eu consegui ir lá pegar ela. Paguei o conserto no cartão, é claro. - desabafo. ― Que barra, hein amiga. Mas, e o seu noivo? Ele não te ajuda com nada? ― O Hugo? Hugo está desempregado, ou pelo menos estava. Hoje ele foi fazer uma entrevista de emprego, espero que tenha dado certo. ― Ele não tinha chegado ainda, quando você chegou do trabalho? ― Não. Mas quer saber? Não vou ficar esquentando a minha cabeça com o Hugo. Preciso focar nos estudos. ― É isso ai, Ag. - ela confere a hora no relógio. ― Já está na hora, vamos lá? ― Vamos. - jogo o lixo na lixeira e caminhamos em direção a sala de aula. Rafael Acordei no meio da noite com uma dor de cabeça horrível. Parece até que vai rachar ao meio. Me levantei e fui com as mãos na cabeça até a cozinha, onde eu guardava uma caixa com analgésicos e antitérmicos. Peguei um comprimido e engoli com água. Fui até o sofá e me deitei lá. Esse caso está tirando o meu sossego, e o pior é que eu sei que está longe de terminar. Eu nem ao menos consigo dormir direito desde que essa investigação começou. Fiquei um tempo deitado no sofá, pensando em como solucionar esse caso, mas também em como seria se em uma dessas noites como essa de hoje, eu tivesse alguém para trazer meu sono de volta, ou me fazer perder o sono de vez, mas de um jeito bom, é claro, para me fazer um carinho e dizer que tudo vai dar certo, que eu preciso confiar mais em mim mesmo. Eu não tenho certeza de como seria, mas sinto que não seria r**m. Na manhã seguinte, acordei todo dolorido por ter pegado no sono deitado todo torto no sofá. Felizmente, a dor de cabeça havia sumido. Tomei um banho rápido, peguei minhas chaves, carteira e distintivo e sai. Apertei o botão para chamar o elevador ao mesmo tempo em que um casal saiu do apartamento ao lado, eles pareciam ter entre 25 e 30 anos. Ele segurava ela pelo braço, enquanto ela tinha os olhos presos no chão. Fiquei observando tudo de canto de olho até o elevador chegar. O elevador chegou, e o homem ainda segurando a mulher pelo braço a empurrou para dentro, eu entrei atrás e apertei o botão que levava à garagem. ― Ai! Está me machucando. - disse a mulher num sussurro, porém consegui ouvir. ― Cala a boca! - foi a resposta do marido, também em voz baixa. Respirei fundo, esse filho da p**a tá de brincadeira. Se ele pensa que vai ficar agredindo a mulher, ainda mais perto de mim, ele está muito enganado. Eu não mantenho amizade com vizinhos, então ninguém sabe que sou policial, além do porteiro. Meu distintivo está no bolso, eu o pego e penduro no pescoço antes de me virar para eles. ― O que está acontecendo aqui? - perguntei. O olhar do cara veio direto para o distintivo no meu pescoço. A mulher intercalou seu olhar entre mim e o seu marido, e acabou optando por fixar os olhos no chão. ― Está querendo que eu repita? - falei mais alto, chegando um pouco mais perto dele. ― Não está acontecendo nada. - diz com presunção. ― Ah não? Não está? Acho que a sua esposa pode responder melhor essa pergunta. - me viro para ela, que levanta o olhar devagar. ― Seu marido está te agredindo moça? Uma lágrima rolou de sua face e ela negou com a cabeça. Eu suspiro. ― Bom, não é o que está parecendo. - indico seu braço, que ainda está firmemente segurado pela mão do marido, tão firme, que as marcas dos seus dedos estão ficando sob sua pele. ― Cuide da sua vida. Não se intrometa em assuntos que não te dizem respeito, isso não é da sua conta. - o homem praticamente cospe as palavras na minha cara. ― Aí é que você se engana. O errado é da conta de todo mundo. Com um gesto rápido viro ele para a parede, prendendo suas mãos atrás das costas. ― Me solta! Tá fazendo o que?! - diz entredentes. ― Não sei se você percebeu, mas eu sou policial, mas precisamente, delegado da 14ª DP do Rio, seu filho da p**a. Você está preso por violência contra a mulher. ― O que?! Eu não fiz nada, você não pode me prender assim. Fala para ele Mônica, fala que eu não fiz nada com você. Fala c*****o! - ele grita exaltado. A mulher está em um canto do elevador, abraçada a si mesma. Enquanto lágrimas silenciosas rolam do seu rosto. ― Cala a boca. - aumento minha pressão sobre seus punhos. - E moça, nem adianta negar. Seu corpo está cheio de hematomas. A porta do elevador se abre. Com o indivíduo em meu poder, eu destravo o carro, pego uma algema de dentro e coloco no infeliz. Depois, jogo ele no banco de trás do carro. ― Onde você está me levando? ― Qual a parte do VOCÊ ESTÁ PRESO, você não entendeu? - ele se cala, se dando por vencido. ― Moça, você vem também. Preciso colher seu depoimento. ― Mas... - ela diz, indecisa, ainda abraçada ao próprio corpo. ― Mas o que? Você não quer que o seu marido seja preso? Quer que ele continue batendo em você, é isso? ― Não... eu... ― Não. Foi o que pensei. Agora, por favor, entre. - abro a porta do carona para ela. A mulher entre receosa no carro. ― E você aí atrás, trate de ficar bem caladinho. Ligo o carro e dirijo rumo a delegacia. O dia hoje já começou do jeito que eu gosto: comigo prendendo agressor de mulher.
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