— Eu acho que você está se precipitando.— Aconselhou Rodrigo, não gostando nada de ver a forma com a que Eugênio parecia cego pelo advogado novato.
— O meu faro não me engana, Rodrigo. Em apenas cinco dias o rapaz já mostrou o seu potencial. Ele intermediou transações que até advogados mais antigos têm dificuldades. Ele conseguiu fechar negócios que eu mesmo estava tendo certa dificuldade.
— Você arriscou demais. Se ele não tivesse conseguido, poderia ter colocado tudo a perder.— Rebateu Rodrigo, irritado.
— Eu não teria arriscado se não soubesse aonde estou pisando. Eu sou uma raposa velha nos negócios, Rodrigo, pergunte ao seu pai.
— O tipo ainda não tem uma semana aqui e já queres efetivá-lo.
— Sim, quando acabar o contrato de três meses, o que não significa que ele precisa ficar a par disso. Pare com essa tolice, o rapaz não te fez nada.
— Em três meses muita coisa pode acontecer, Eugênio. Além disso, o tipo é misterioso demais, não acho confiável.
— Ele só é um rapaz mais reservado.
— Não sei... Algo me diz que esse Thomas não é quem diz ser. Se procurarmos, com certeza vamos achar.
— Deixe o sexto sentido para as mulheres, meu caro. Nós temos muito trabalho a fazer, não temos tempo a desperdiçar.
— O meu pai está com o governador. Seus homens estão trazendo novos carregamentos de pedras preciosas e já estão passando pela fiscalização.
— O governador conseguiu fazer com que a polícia aprove a entrada para Aventine?— Perguntou Eugênio, preocupado.
— Sim, pediu o valor de sempre. Trinta por cento do lucro sobre a venda.
Eugênio bufou, contrariado.
— Aquele governador é um pulha. Nunca pede os lucros sobre o custo, pede sempre mais alto.
— Bom, ao menos conseguimos ter um bom retorno e sem a fiscalização no nosso pé.— disse Rodrigo.
— Muito cuidado quando estiver casado com a Júlia, rapaz. Ela não faz ideia da origem dos nossos negócios. A minha filha saiu moralmente correta demais, fora que ainda é muito imatura, questiona bastante. Não tem cabeça para saber de nada.
— Vamos mesmo precisar passar um tempo fora de Aventine?— Perguntou Rodrigo.
— Sim. Vocês partem logo depois do casamento. Homens dos Messina foram vistos na cidade, essa maldita praga nunca vai deixar de existir.— Novamente, Eugênio bufou, contrariado.— E eu que pensei que acabando com a vida do Leandro Messina acabaria com o m.al pela raiz. Achei que dez anos seria o bastante para ultrapassar os Messinas nos negócios, mas dei com os burros n'água. Aqueles malditos têm um esquema muito forte.
— Ainda sobraram os filhos dele, não é?
— Sim. Os dois eram crianças quando o pai morreu. Me arrependi de não ter acabado com a raça deles de uma vez.
— É isso o que acontece quando se tem muita compaixão.— Comentou Rodrigo.
— Eu tinha três filhos pequenos em casa, Rodrigo. Dois deles com idades próximas a dos meninos, foi impossível ter o sangue tão frio.
— Bom... Então não adianta se lamentar, Eugênio. Você poupou a vida deles, mas eles não pensarão duas vezes em acabar com a vida dos seus filhos.
— É pela Júlia que mais temo.— Eugênio respirou fundo, antes de caminhar até a grande janela de sua sala, que daria para a linda vista do centro de Aventine.
— Eu protegerei a Júlia. Acha mesmo que aqueles matutos ignorantes vão se meter a b***a com a nora do prefeito?
— Eles são espertos, Rodrigo, podem tentar se infiltrar entre nós.
— Acha mesmo que eu não reconheceria um bronco ignorante de Rosa Rosso?
— Primeiro passo para você ir bem em negócios como o meu, rapaz...— Eugênio voltou-se para o genro com cara de poucos amigos.— Nunca subestime o seu inimigo. Ele pode está mais próximo do que você imagina.
Do outro lado da porta, com os ouvidos atentos e o gravador na mão, Tom captava toda a coversa que acontecia dentro da sala de Eugênio.
...
Já era por volta das duas da tarde quando um grupo considerável de homens cercou Eugênio e seus capangas na saída da fábrica. O homem estava prestes a ir para uma reunião de negócios, quando o líder deles se pôs na frente do automóvel com a pistola apontando na direção da testa dele.
Eugênio estava pálido ao ver que seus homens também tinham sido rendidos.
Ele sempre soube que morreria jovem, afinal de contas, qualquer pessoa que fosse peça da guerra entre os Santiago e os Messina acabava sendo morta prematuramente, principalmente quando esse alguém era o chefe de uma das famílias.
— Calma, calma... Podemos negociar.
— Você não quis negociar quando matou o meu tio Leandro. Não foi assim? Em uma emboscada?— Perguntou Fernando, que tomava a liderança do ataque.
Eugênio engoliu em seco, não tinha muito o que argumentar.
— Vocês estão na minha cidade. Com certeza não sairão vivos daqui. Têm homens meus espalhados por todo o canto, a minha família é tão grande quanto a sua.
— Você também invadiu Rosa Rosso na época, não lembra?— Fernando esboçou um sorriso curto e sombrio que fez a espinha de Eugênio gelar.— Vai valer a pena correr o risco de perder a vida, se for para acabar com a sua.— ele chegou a pressionar o gatilho, antes de enxergar o cano de um revólver bem próximo á sua testa.
— É melhor você recuar, ou estouro os seus miolos antes de você conseguir puxar esse gatilho.— disse Tom, com a sua melhor voz sombria.
— Têm muito dos meus homens ao redor...— Fernando tentou justificar.
— Eu sei, e é só por isso que eu vou poupar a sua vida. Mas primeiro, você vai me entregar a sua arma e os seus homens vão recuar.
— O que me garante que os homens de Eugênio Santiago não vão atirar?— Perguntou Fernando.
— Você vai ter que confiar na minha palavra assim como eu vou confiar na sua.
Fernando fez exatamente o que Tom instruiu que fizesse, ele recuou e fez com que os outros cedessem também.
Aparentemente, Tom evitou uma matança em Aventine, deixando os inimigos irem embora.
Eugênio ainda estava trêmulo quando retornou para a sala, com a ajuda de Tom e de seus outros homens.
Aquele ato heróico do Tom só deixou Rodrigo ainda mais irritado e cismado contra ele.
— Não costumo ser um homem de grandes emoções, mas hoje eu vi a morte bem de perto.— Desabafou Eugênio, ainda com a respiração alterada.
— Que sorte o Thomas está por perto, não é?— Perguntou Rodrigo, com ironia.— O Thomas parece sempre está por perto, pronto para algum ato de heroismo.
— Melhor do que nunca está por perto, como você— Rebateu Tom, lançando para o outro o seu melhor olhar de indiferença.
— Chega, rapazes. Eu acabei de passar por um dos momentos mais tensos da minha vida, não quero discussões bestas!— Exclamou Eugênio, ainda alterado.
— Bom... Com licença, ainda tenho trabalho para terminar.— disse Tom, antes de se afastar até a porta.
— Rapaz, espere.— disse Eugênio, o fazendo parar.
Tom voltou-se para ele devagar.
— Hoje, mais uma vez, você provou que é um homem que tem potencial para fazer parte da corporativa da fábrica. Melhor ainda, você salvou a minha vida e se mostrou de grande valia e confiança...
— Eugênio...— Rodrigo tentou dizer algo, porém o mais velho apenas ergueu uma das mãos, dizendo para o outro se calar.
— Como forma de agradecimento eu quero que você faça parte da fábrica, vamos te contratar efetivamente...
Tom quase gemeu de decepção. Não era isso o que ele estava esperando. Dane-se a maldita fábrica, ele só queria colocar o plano em ação e fugir com Sofia para bem longe daquela confusão.
— E também, eu quero te convidar para a festa de noivado da minha filha que será realizada na próxima semana, no sábado.
— Agradeço muito a oportunidade e o convite, doutor Eugênio. Conte com a minha presença.— disse Tom, antes de finalmente sair da sala.
Agora, sim, Rodrigo estava cuspindo marimbondos.
— Eu não estou te reconhecendo, Eugênio. Desde quando coloca estranhos dentro de casa?
— Ele não é um estranho, é o meu funcionário e salvou a minha vida.
— Um estranho que está aqui há menos de uma semana!
— Sim, e já se mostrou ser o melhor funcionário nos dois primeiros dias. Homens habilidosos e leais como o Thomas estão em extinção, não posso abrir mão dele. Além do mais, ele salvou a minha vida, é o mínimo que poderia fazer nessa ocasião.
Cansado de discutir com o sogro, Rodrigo simplesmente se retirou da sala, em silêncio.
Não dava para tentar obrigar um cego a enxergar. Ele tomaria as próprias medidas e descobriria qualquer coisa que pudesse afastar Thomas dali.
O faro de Rodrigo não falhava, algum mistério sombrio existia na vida do Thomas.
...
O final de semana passou em um piscar de olhos, mas para Tom e Júlia havia durado uma eternidade. Durante todos os dias da semana eles se encontraram na vila, praticamente faziam o mesmo. Assistiam a alguma peça, visitavam a feira de exposições artesanais e finalizavam a noite com um piquenique enquanto conversavam e olhavam as estrelas.
As vezes, Júlia se sentia como a personagem de um filme. Ela já não estava aguentando esconder aquele segredo, embora ainda não tivesse reunido coragem necessária para contar.
Na cabana ela pretendia revelar para o homem a sua verdadeira identidade, mas tudo estava tão extraordinário que ela não queria correr o risco de estragar o momento.
Assim que chegaram, os dois resolveram aproveitar o lindo sol que estava fazendo. Eles colocaram seus trajes de banho e se lançaram no rio que ficava bem en frente a casa. Nadaram, brincaram de jogar água um no outro e se beijavam sempre que podia. Tom ergueu Júlia no colo, levando-a para uma pequena cachoeira que tinha para a outra extremidade do rio.
Submergidos na correnteza, Júlia puxou Tom pelos ombros, roubando-lhe um outro beijo. Os lábios se encontravam vagarosamente, um saboreando o outro sem pressa. Júlia brincou a língua por cima da dele, enquanto as mãos grandes do Tom cobria a curvatura da cintura e deslizava para as nádegas voluptuosas.
Ela entreabriu os lábios, arquejou ao senti-lo tocar partes proibidas de seu corpo. Primeiro, ele apertou com força as nádegas dela. Depois, apertou as coxas grossas e enfiou as mãos pela parte interna delas.
Júlia experimentou a sensação de um calor corrosivo que nasceu no final de sua barriga e foi se espalhando pelo corpo, até se concentrar no meio das pernas, em sua carne macia.
Tom precisou se afastar para não cometer nenhuma loucura. O seu corpo estava prestes a entrar em combustão, ele pulsava do dedo mindinho até o m****o ereto. Não encostaria um dedo na moça até se casar com ela, mas se continuasse naquele ritmo, acabaria arrancando os trajes de banho e metendo os pés pelas mãos.
Ele mergulhou logo em seguida, precisava esfriar o corpo. Júlia acabou fazendo o mesmo.
No final da tarde, quando o sol estava se pondo e eles já estavam secos o suficiente, os dois se sentaram na ponte que dava para a beira do lago e começaram a ler o livro " A idade da razão" de Jean-Paul Sartre, lançado no ano anterior, em 1945, embora a história se passasse na década anterior, nos anos 30.
Como o cair do dia havia esfriado, Júlia trouxe uma coberta grossa que estava dentro da casa para ambos dividirem, e fez um delicioso chocolate quente.
Eles alternavam a leitura em voz alta, um capítulo narrado por Júlia, outro por Tom. Eles se divertiam com a forma que cauda um interpretava os personagens.
Logo depois, Tom precisou levar Júlia de volta para a cidade
— Eu nem acredito que o dia passou tão rápido.— Comentou Júlia, cabisbaixa, quando já tinham chegado na vila.
— Amanhã teremos mais.— Tom a puxou pelo braço, trazendo-a para si e a beijando mais uma vez.
— Amanhã jantaremos juntos e com vinho.
— Mas o seu pai...
— Ele não vai perceber nada, amanhã é o dia que fica até tarde no clube do charuto.
— Tudo bem, mas aviso que não vou te deixar beber demais, você não tem o costume.
— Não precisa se preocupar, eu sei me conter.— Júlia parou de caminhar repentinamente, ficando de frente para o rapaz.— Amanhã ás duas da tarde?
— Amanhã ás duas da tarde.— Confirmou Tom, antes de se despedir dela com um beijo.
Júlia voltou para casa se sentindo leve como uma pluma, adentrou a sala de estar a dançar.
Logo foi interrompida por Rodrigo, seu noivo, que estava com cara de poucos amigos.
— São quase sete da noite, Júlia.— Rosnou o homem, furioso.— Aonde esteve a tarde toda?