Durante o jantar em sua casa, Simon não teve sequer um minuto de paz. Thomas, seu cunhado, estava furioso com a decisão que ele tinha tomado, e não deixaria aquilo passar em branco.
- É um absurdo que queira promover a sua secretária, que m.a.l pisou na empresa, e que sequer tem experiência, como diretora financeira.- Resmungou Thomas, ocupando o outro lado da mesa, ao lado de sua esposa - irmã mais nova de Simon-, e de seus dois filhos: Rodrigo de 7 anos, e Gustavo de 5.
- Você fez mesmo isso, meu irmão?- Perguntou Bella a Simon, com os olhos arregalados.
O homem respirou fundo, juntando os seus últimos resquícios de paciência, para poder prosseguir com aquela conversa. As vezes achava que moravam pessoas demais naquela mansão, principalmente quando decidiam opinar em sua vida particular. Geralmente, sua irmã e seu cunhado eram como móveis da casa. Seus sobrinhos, por serem mais velhos que seus filhos, passavam o dia no colégio, desempenhando atividades, enquanto Bella e Simon podiam preencher seus minutos com trabalho ou cuidando de assuntos pessoais. Por mais que tivessem duas babás disponíveis para cuidar das quatro crianças que residiam naquela casa, Simon sabia que não era o mesmo que dar aos seus filhos um amor de mãe.
Embora o ambiente nunca estivesse completamente vazio, quando se tratava de dar afeto e atenção, os seus gêmeos Samuel e Maria Alice tinham uma enorme carência por parte dos tios, e principalmente dele mesmo, que havia se tornado escravo do trabalho.
- O diretor financeiro que o nosso tio escolheu não serve para nada. Eu preciso desempenhar todas as funções dele porque não tem o menor comprometimento com o trabalho, e devido a isso sequer posso ser um pai presente para os meus filhos.- Explicou Simon.
- Tudo bem, eu entendo que o tio Agno contratar o Elias não foi a melhor opção, mas precisava ser uma moça inexperiente? Ainda mais a sua secretária. Fala a verdade, Simon. Você está interessado na mulher.- Acusou Bella.
- Eu não sou um inconsequente e irresponsável, Isabela.- Simon rebateu a sua irmã com aspereza, lançando um olhar tão fulminante para a mesma, que a fez engolir em seco.- Eu não promovi a moça, fiz um acordo com ela. A Laura é formada em economia, tem experiência em grandes empresas, como a Espósito… E hoje, já em seu primeiro dia de trabalho, mostrou ser uma jovem muito competente. Ela percebeu erros significativos que comprometem os lucros e o capital de giro da empresa…-
- Sem esses termos técnicos, você sabe que não suporto.- Reclamou Bella.
- Tudo bem. A Laura percebeu que estávamos com problemas na colheita, e que esse método errado estava comprometendo a qualidade dos vinhos. Também percebeu uma superprodução, principalmente em meses que não tinha muita saída. Ela deu soluções para nos reorganizarmos financeiramente, e a minha proposta foi que, se o método dela funcionar, se tivermos um controle nas produções e saídas, e se aumentarmos o nosso lucro até o final do outro mês, ela será promovida a diretora financeira, mas até lá, continuará como minha secretária.-
- Ainda acho um absurdo.- Disse Bella.
- Você não tem que achar nada. Eu sou o presidente da empresa, e sócio majoritário. As ordens são minhas, e há tempos percebi que a maior besteira do tio Agno foi contratar esse Elias como diretor financeiro. Se a Laura se mostrar competente, como eu sei que vai, o cargo será dela. Entre outras coisas, terei mais tempo para ficar com meus filhos.- Rosnou Simon.
- Entre outras coisas?- Perguntou Thomas, com medo de insistir no quão absurdo era contratar aquela moça inexperiente, mas com medo de receber uma resposta ainda p.i.o.r do que a recebida por sua esposa.
- Assuntos meus, cunhado.-
- O Thomas estudou na melhor universidade de Nova York. Tem especializações, e desempenha um ótimo trabalho como contador. Por que não o promove como diretor financeiro?- Sugeriu Bella.
De fato, o seu cunhado era muito competente como contador, mas ainda assim, Simon o achava ambicioso demais. Não tinha confiança para dar ao outro um cargo tão alto. A família de Thomas é muito rica, o mesmo é herdeiro de inúmeras fazendas no interior de São Paulo, mas nunca se interessou por nenhuma delas. Como filho único, quando seu pai morresse, tudo seria dele, e sabe-se lá o que Thomas faria, quando tivesse poder.
Simon não duvidava que seu cunhado fosse capaz de puxar o seu tapete a qualquer momento. Embora não conhecesse Laura - ainda-, algo nos olhos daquela moça o fazia confiar nela. Claro que não arriscaria tão alto na sua intuição.
O primeiro que fez assim que chegou em casa, antes mesmo do jantar, foi contatar o seu detetive particular e de extrema confiança. Até o final do outro mês, o mesmo prazo que tinha para conferir se os lucros da empresa realmente aumentaram, Simon queria um dossiê completo de sua secretária, em sua mesa.
Se realmente ela fosse uma pessoa honesta, sem manchas no passado, ou sem nenhum segredo sombrio, ela não apenas seria promovida a diretora… Receberia de Simon uma proposta ainda melhor, que garantiria conforto para sua filha e para ela, pelo resto de seus dias.
- Eu sei o que estou fazendo. Desista, irmãzinha. Não vou mudar de ideia. Se a ideia da Laura conseguir aumentar os nossos lucros, ela será a nossa diretora financeira.- Simon abriu o seu melhor sorriso, antes de voltar a se concentrar em seu jantar.
Bella não ficou conformada com aquilo. Esperou que Simon e as crianças se retirassem da sala de jantar, para continuar a conversa com o seu marido.
- Não é nada justo com você essa situação, meu amor. Se dedica tanto naquela exportadora… Além do mais, eu sou dona de dez por cento das ações. É justo que o meu marido seja no mínimo diretor financeiro.- Disse a mulher, pensativa. Ela continuou sentada à mesa, mesmo após a sobremesa.
Assim como ela, Thomas tentava pensar em algo.
- Não podemos permitir que uma mulher vire a cabeça do seu irmão desse jeito.-
- Ela é muito bonita?- Perguntou Bella, mesmo possivelmente já sabendo que ficaria incomodada com aquela resposta.
- Bastante bonita. Tenho certeza que seu irmão ficou interessado nela. Claro, como sempre, bem discreto, mas o comportamento dele não engana. Muito atencioso, muito disposto a ajudar alguém que m.a.l conhece… Certeza que não é generosidade. Simon tem alguma intenção por trás disso.-
- Seja lá qual for a intenção, eu sei como resolver.- Disse Bella, ficando entusiasmada ao lembrar de algo relevante.
- Como?-
- Lembra da Alexia? A minha melhor amiga que está morando em Paris há alguns anos?- Bella esboçou um sorriso malicioso no canto da boca.
- Acha que ela vai abrir mão de uma vida estabilizada na Europa para vim para cá?-
- Ela é herdeira, tem dinheiro garantido para o resto da vida, como nós.- Bella mordeu os lábios, empolgada com a forma com que as peças estavam se encaixando.- É arquiteta, tem um escritório lá, é formada na Sorbonne… Mas tenho certeza que vai fazer sucesso aqui também. A página dela na internet é muito famosa.-
- E qual o seu objetivo? Juntar a Alexia e o Simon?-
- Eles já namoraram há um tempo. Eram muito jovens, a Alexia tinha dezessete… Isso foi antes do Simon viajar para os Estados Unidos, para fazer faculdade lá.-
- Acha que ele ainda pode sentir algo por ela?- Perguntou Thomas, não muito confiante com aquilo.
- Bonita e astuciosa como a Alexia é… Tenho certeza. Essa tal de Laura que se prepare, porque ela vai ganhar uma concorrente à altura.-
…
No outro dia, Laura acordou bem cedo, para não se atrasar para o trabalho. Deixou pronto também o café da manhã para toda a família, que fazia questão de se levantar às seis da manhã para fazer a primeira refeição do dia na companhia da mesma. Na hora de ir embora, Laura deixou um beijo no rosto de sua mãe, e outro no rosto da Sophie, instruindo-a a se comportar e obedecer a avó. De longe, o detetive contratado por Laura a observava, já preparando o relatório que precisava entregar para Simon. Tirou fotos da moça com a família, e em seguida, contatou uns contatos importantes da receita federal para conferir a situação dela.
Também sondou com os vizinhos da redondeza, e foi até o ponto que era a antiga confeitaria de Laura. Conseguiu coletar dados o suficiente, para saber que, de fato, o ex marido da moça a deu um golpe, e que, inclusive, havia um processo contra ele, em andamento.
Laura não fazia ideia do tamanho do interesse de seu chefe por ela. Percebeu que Simon tinha aprovado suas sugestões comerciais, e se esforçaria ainda mais para alcançar o cargo de diretora financeira. Aquela era a oportunidade que ela precisava para tentar reabrir a sua confeitaria.
A moça chegou na empresa antes mesmo de seu chefe, e já providenciou a organização de algumas planilhas, no computador, de acordo com data e importância.
Simon ficou muito satisfeito ao perceber o quanto Laura estava empenhada em se mostrar eficiente. Ela parecia prestes a lutar com unhas e dentes por aquele que ele estava oferecendo.
- Bom dia, Laura.- Disse Simon, assim que cruzou pelo espaço que a moça ocupava, de frente para a sua sala.
- Bom dia, doutor Simon.- Respondeu a jovem, concentrada em seu computador.
Ele pensou em fazer uma observação quanto ao “ doutor”, já que tinha pedido para a mesma não ser tão formal quando estivessem a sós, mas resolveu ignorar.
- Alguma ligação importante até agora?-
- Um dos seus investidores ligou para confirmar o almoço. Posso dar o retorno?-
- Pode. Não só pode, como quero que esteja presente.-
Laura arregalou os olhos, surpresa. M.a.l tinha um dia de trabalho, e já tinha dado passos muitos importantes.
- Não entendo a surpresa.- Disse Simon, apontando o sobressalto da moça.- Ontem você me mostrou que entende muito bem do assunto, deu ótimas sugestões que têm tudo para funcionar, e se funcionar como acho que vou, o cargo é seu. É quase certo, Laura, é mais do que justo que já vá entendendo melhor como funciona a exportadora, que vá conhecendo cada vez mais o nosso negócio.-
Laura sentiu um frio estranho na barriga, ao ouvi-lo falar a palavra “ nosso”.
- Tudo bem. O senhor está apostando muitas fichas em mim, e eu também preciso apostar.- Laura respirou fundo, soltando o ar devagar, antes de ligar para o tal investidor.
Na hora do almoço, como o combinado, os dois foram juntos para a tão esperada reunião. Thomas, apenas os observava, de longe, precisando se conter muito para não explodir toda a sua raiva. Não perdeu tempo em ligar para a sua esposa, que também tinha notícias referentes ao assunto.
- O seu irmão acabou de levar a protegida dele para uma reunião muito importante de negócios. Estou te dizendo, aos poucos, essa menina vai estar mandando em todos nós. Isso de colocar prazo até o final do mês que vem é apenas para ganhar tempo, para não ficar tão óbvio o favoritismo dele.- Despejou Thomas, trancando-se em sua sala para que ninguém o ouvisse.
- Não fique tão atordoado, meu amor.- Disse Bella, do outro lado da linha. A jovem estava girando na cadeira de seu escritório, na sua sala, em sua clínica de estética. Por ser médica, Bella tinha autorização de fazer procedimentos mais aprofundados.- Acabei de falar com a Alexia. E adivinhe? Daqui para o mês que vem ela está chegando no Brasil, está só esperando o escritório dela ficar pronto.-
- Tem certeza que isso vai funcionar? Tem certeza que a Alexia consegue colocar essa Laura para correr? Porque eu estou realmente preocupado, o seu irmão parece enfeitiçado. A garota começou a trabalhar aqui ontem e já está praticamente promovida a diretora financeira. Não acha tudo prematuro demais?-
- Claro que acho. Mas será que o faro do meu irmão não encontrou mesmo alguém boa o bastante para substituir o Elias?- A mulher mordeu os lábios, apreensiva.
- Ficou maluca, Isabela? Está insinuando o que? Que uma franguinha sem experiência seja melhor do que o seu marido?- Perguntou, irritado.
- Claro que não, meu amor. Mas se os conselhos dessa moça foram mesmo bons para a exportadora…-
- Eu aposto como foi o seu irmão que a instruiu a falar aquilo, apenas para que ela fingisse que sabe de algo. Não tenho dúvidas. Se você conhecer a moça pessoalmente… Ela é bonita demais, Bella. Com um único dia na empresa já se deu bem, isso não existe em lugar nenhum, acho que nem nos livros. O seu irmão está favorecendo a moça, sim, porque tem interesse nela.-
- Desde a morte da Paloma ele se envolve com outras mulheres, mas nunca foi irresponsável ao ponto de misturar o pessoal com o trabalho.-
- Essa moça é esperta, e tenho certeza que ela deu um jeito de enrolar o seu irmão. Escuta, Isabella, a situação é mesmo preocupe. Sabe-se lá o espaço que ela pode tomar na vida do Simon, se a Alexia não chegar de uma vez.
…
No conforto de seu quarto, após um dia exaustivo de trabalho, Alexia estava muito bem acomodada em sua cama, acessando o perfil de Simon nas redes sociais. Bella, sua amiga, havia adiantado um pouco da situação, e parece que o rapaz se encontrava em uma fria.
Pelo que conhecia dele, desde a morte de sua esposa, após o parto dos gêmeos, Simon nunca mais teve um relacionamento firme com alguém, e provavelmente essa tal mulher que está virando a sua cabeça, encontrou meios de tocar no ponto frágil dele.
Mas Alexia o conhecia há tempo demais para saber o que precisava fazer, caso quisesse afastar alguma pistoleira. Simon não suportava gente interesseira, e tampouco, alguém que quisesse enxergar os seus filhos como segundo plano.
Se as crianças não aceitassem a tal Laura, dificilmente Simon ficaria com ela.
Alexia mordeu os lábios lábios, maquinando sobre o que poderia fazer para colocar os pequenos nessa guerra. Soltou o seu tablet na cama, em seguida, esticando os braços e as pernas na cama, ao se espreguiçar.
- Vai mesmo abandonar a sua vida aqui em Paris?- Perguntou Lucille, assistente pessoal da moça.
- Vou deixar o meu apartamento alugado. Caso mude de ideia… Tenho para onde voltar.- Alexia voltou a se sentar no colchão, bastante animada.- Uma vida nova me espera em Bela Rosa. Uma vida de ainda mais luxo.-
- Você já tem dinheiro para te garantir para o resto da vida, Alexia…-
- Dinheiro nunca é de mais.- Disse, colocando um dos dedos em riste.
- Se o tal Simon está mesmo apaixonado pela outra, como vai fazer para tirá-la do caminho?-
- Se eu conseguir comprar esses pestinhas com presentes, atenção, passeios… É claro que vão preferir a mim.- Alexia gargalhou, quase beirando a histeria. Estava ansiosa demais para colocar os pés de volta em Bela Rosa.- Aquela cidadezinha xexelenta vai abrir ainda mais portas para mim. Com a fortuna do Simon, vou ficar ainda mais rica. Claro, vem aqueles pentelhos de brinde…-
- Você não suporta criança, Alexia. Como vai conseguir disfarçar por tanto tempo?-
- Tenho os meus meios. Depois convenço o Simon a colocá-los em um colégio interno.-
- Se ele é mesmo tão louco pelos filhos, acho muito difícil.- Contrapôs Luci.
- Como disse, tenho meus meios. Posso convencê-lo de que é o melhor para a educação dos meninos. O Simon já foi muito apaixonado por mim, e basta apertar o gatilho certo para ser de novo. Homem apaixonado fica cego, Luci, e com as palavras certas, você arranca dele o que ele quiser.-
- Você é mesmo perigosa, Alexia.-
- Sou, e muito, principalmente quando quero algo e tem alguém no meu caminho. Quer saber? Já tenho pena dessa tal de Laura, porque prontamente vai ser descartada. Afinal… O Simon não vai preferir uma reles secretária a mim.-
- Vai mesmo usar todas as suas armas contra ela, não é?- Perguntou Luci.
- Depende do quão forte for a minha oponente, Luci. Mas vou fazê-la entender qual o seu devido lugar. Vou fazê-la entender que alguém de um calibre tão baixo, não tem espaço na vida do Simon.-
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Muito obrigada por estarem acompanhando essa história, que estou fazendo com tanto carinho. Cada um de vocês são especiais, e me inspiram para que cada dia faça um capítulo inédito.
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