Acidente

1415 Words
     Adoraria acordar e descobrir que tudo foi um pesadelo. Mas só o que eu conseguia, era tentar entender o porquê de as coisas acontecerem assim. E agora eu estava ali, olhando o mar ao amanhecer.      Guilherme havia comprado a casa três anos atrás, no nosso aniversário de casamento. Lembro-me como se fosse ontem. Ele me fez uma surpresa, na noite em que completamos sete anos de casados. Ele me levou para jantar e disse que iríamos passar a noite fora. Eu adorei a ideia, mas não achei que iríamos tão longe. Fiquei inquieta a viagem toda, mas quando chegamos, assim que ele estacionou, tirou uma caixinha do bolso e me entregou. A princípio, eu achei que era um anel um brinco talvez, mas quando abri me surpreendi. Era uma chave eu fiquei sem reação.      Uma casa na praia!     Nossa! Era mais um dos nossos sonhos que havia se tornado realidade.      Aquela noite foi mágica. Fizemos amor no tapete da sala,  à luz da lareira. Era como se fosse um conto de fadas, e estava tão feliz, que não faltava mais nada para me completar. Ele me bastava, como se fosse o ar que eu respirava. Não precisava de nada, tudo que eu queria estava ali.      Eu adormeci em seus braços, e quando acordei na manhã seguinte, não o encontrei. Levantei-me e vesti sua camisa. Olhei para varanda, e vi que estava aberta.      Ele estava lá, usando somente a calça do pijama, que devia estar na mala que ele havia feito escondido, antes de sairmos de casa. Sua pele branca e seu abdômen definido exalavam uma beleza quase que sobrenatural. Seus olhos estavam fechados, suponho que sentindo a brisa do mar, mas mesmo assim ele sentiu minha presença.      Eu poderia ficar olhando para ele durante horas que nunca iria me cansar.      - Sei que está me admirando, mas adoraria que se juntasse a mim. - Ele disse ainda de olhos fechados.      - E como sabe que estou aqui? - Eu perguntei.      - A brisa trouxe seu perfume até mim. - Ele disse e eu sorri me aproximando dele.      - Eu ficaria te olhando por horas. - Falei dando um beijo no seu peito nu. Ele sorriu e me abraçou beijando meu cabelo.       - Olha esse mar.     - É lindo! - Eu disse sem tirar os olhos do mar. Então ele se afastou, segurou meu queixo e seus olhos escuros penetrantes, encontraram os meus.      - Não mais que você. - Ele falou entrelaçando os dedos no meu cabelo e me puxando um beijo avassalador. Ali, eu tive certeza que jamais iria amar outro homem como ele. Eu era inteiramente dele.      Lembrar-me disso me fez chorar. O que era totalmente normal, pois eu não sabia fazer outra coisa nos últimos tempos. Ficava pensando até quando eu ia me martirizar assim.      Era como se meu corpo estivesse anestesiado e eu perdesse todos os sentidos, porque quando percebi,  já estava indo em direção a lancha dele.      Minha vontade era de destruí-la, mas não o fiz apenas entrei e dei a partida.      Na verdade, eu não sabia como usar aquilo de maneira correta, e em uma manobra para voltar ao cais, a lancha bateu na boia e eu caí no mar. Depois disso, não me recordo de muita coisa. Lembro-me apenas de que acordei com a cabeça doendo, deitada na areia da praia com Jean fazendo uma massagem no meu peito, que por sinal também estava dolorido, para tentar me reanimar.      - Está tentando se matar? - Ele falou, quase gritando, enquanto eu tossia e jogava um enorme  quantidade de água pela boca e pelo nariz.       - Minha cabeça...      - Não toque aí, tem um corte enorme e está sangrando. - Ele disse segurando meu braço.       - O que eu fiz... - Não era bem uma pergunta.     - Apenas bateu com a cabeça numa pedra. Você poderia ter morrido.  Vamos, vou te ajudar a ir para casa e, obrigado Sr.  José. - Jean agradeceu.      Era isso, queria ter morrido. Meu corpo estava dolorido e ele me ajudou a chegar a casa. Que vergonha! Além de Jean, o Sr.  José, que cuidava dos barcos no cais, havia presenciado minha investida, sem sucesso , de pilotar a lancha. Não havia notado que ele estava lá quando subi no cais.       - Fica aqui, que eu volto num minuto. - Disse Jean, colocando a manta do sofá nas minhas costas. Minhas roupas estavam ensopadas. Estava com muito frio e minha garganta doía por causa da quantidade de água salgada que eu engoli.      O que eu estava pensando? Eu não era assim. O que me definia naquele momento era a palavra desequilíbrio.      Desequilibrada! Assim era como eu estava.       Em menos de cinco minutos, Jean voltou com uma maleta branca. Sentou-se ao meu lado e começou a manusear luvas e uma agulha com linha, e depois pegou uma seringa.        - O que está fazendo? - Perguntei meio zonza.    - Vou ter que suturar. O corte foi bem feio. - Ele falou tranquilamente.         - Não quero tomar injeção, não sei o que tem aí.       - Ei, relaxa. Não posso dar pontos sem anestesia. Calma, eu sei que estou fazendo.       - Não, de jeito nenhum. Você não vai tocar em mim. - Me levantei, mas cambaleei e num movimento rápido, ele me segurou.        - Tenho que admitir, teimosia é seu ponto forte.      - Não vou deixar você tocar em mim, não sei se está falando a verdade.     Eu não o conhecia. Ele poderia ser qualquer um, até um psicopata. Eu podia pensar o que quisesse,  afinal, bati a cabeça e meu juízo,  não parecia que estava em perfeitas condições. Aprendi a não confiar demais nas pessoas,  elas mentem.      - Resistência! Aqui, minha carteira com CRM. - Ele tirou um cartão de identificação com foto da maleta, onde constavam o nome, Jean Pierre Devereaux, e o número do registro do Cadastro Regional de Medicina. Ele estava falando a verdade.      - Desculpe. - Eu disse me sentando no sofá. - Mas eu não sabia se podia confiar em você, se estava mesmo falando a verdade.      A expressão dele se atenuou. Percebi tensão no rosto dele por eu ter duvidado que ele fosse médico. Ofendido, essa é a palavra correta. Baixei a guarda enquanto ele terminou de vestir a luva e começou a limpar o ferimento. Senti uma pontada quando ele aplicou anestesia, mas depois de alguns segundos, eu não sentia mais nada. Apenas fechei os olhos para não ver e ficar apavorada, pois uma coisa que eu sentia pavor era qualquer coisa relacionada a hospital. Injeção então, nem se fala.      - Prontinho.  Quatro lindos pontos acima da sobrancelha. Eu sugiro que encontre um bom cirurgião plástico, para dar um jeito na cicatriz que vai ficar. - Ele dizia em tom despreocupado, se divertindo.      - Está tão feio assim? - perguntei.      - Depende do ângulo. Olhando de lado parece o Frankenstein.     - Ah, por favor! - Falei em tom de reprovação e ele caiu na gargalhada.      - Melhor você tirar essas roupas molhadas, antes que pegue um resfriado. Eu trouxe um remédio para dor, mas não tenho muitos comprimidos. Acho que terá que ir à farmácia comprar. - Ele desatou a falar, enquanto descartava numa caixinha amarela, o material usado. - Quando terminar,  eu faço um curativo.      - Certo Doutor, mas enquanto isso, também sugiro que o senhor troque de roupa, pois senão vai pegar um resfriado.      - Bom,  acho que está mais preocupada em minhas roupas molharem o sofá, do que eu pegar um resfriado. - Ele disse, revelando um sorriso encantador.  Eu apenas revirei os olhos e fui para meu quarto.      Eu estava péssima e o espelho gritava isso. Tirei a roupa lentamente, e liguei o chuveiro. A água quente amenizou o frio que eu estava sentindo.      Comecei a pensar e Jean. Ele se tornou meu anjo da guarda. Não sei o que teria acontecido se ele não estivesse lá. Provavelmente, meu corpo seria levado pela maré e encontrado por um pescador, ou pior, teria sido devorado por um tubarão      Céus! Não quero nem pensar.      Desliguei o chuveiro e vesti o roupão. Não gostava dos cabelos molhados e antes que a anestesia passasse, liguei o secador. Certamente,  eu sentiria uma dor infernal por causa do corte.    Depois disso, vesti meu pijama e como o combinado, Jean voltou e fez o curativo.      Não pude deixar de notar, mas ele ficava muito bem naquele jeans e camisa social.      Nunca havia reparado em outros homens, e não seria agora que começaria.      Ou seria?!
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