Capítulo 4

2702 Words
Alex tinha esperanças de que não veria Cora no dia seguinte. Depois dos trabalhos árduos que designou para ela, tinha certeza que a garota procuraria o pai aos prantos, implorando que se dedicaria ao vestibular, mas que não suportaria um dia a mais de trabalho. Ethan, como de costume, acreditaria nas promessas da filha e a livraria no castigo, porque seja lá como fosse, Cora sempre conseguia persuadi-lo. Para a aflição do rapaz, a garota era teimosa e obstinada demais, não desistiria com tanta facilidade apenas para mostrar a Alex que ele não a amedrontava. Gostava de um desafio, e gostava mais ainda de ganhá-lo. - Bom dia, Alex.- Proferiu Cora, após pousar o seu computador portátil sobre a mesa. Adentrou o escritório do homem, propositalmente, sem fazer nenhum barulho, a fim de surpreendê-lo. Alex suspirou, frustrado ao constatar que Cora ainda não tinha desistido. Seria uma longa quebra de braço, e ele tinha receio que o resultado acabasse não sendo benéfico para ele. Existiam muitos motivos dos quais gostaria de se livrar de Coraline King-Lenox de uma vez por todas. 1º - A garota era mimada, egocêntrica e egoísta, três qualidades que faziam qualquer pessoa que convivia com ela querer amarrar uma corda no pescoço. 2º- Ela era mandona e implicante, não sabia seguir instruções porque nunca teve regras em sua casa, ou ao menos nunca precisou segui-las, e aquilo fazia com que o trabalho de Alex ficasse cada vez mais difícil. 3º- Ela era bonita, inteligente e perspicaz, o que s tornava atraente para os olhos de Alex - ou de qualquer homem que gostasse de mulher-, mas ele jamais admitiria aquele item em uma lista. Ainda não tinha admitido para si mesmo que Cora era capaz de mexer com os seus desejos mais primitivos. - Vejo que ainda está disposta a trabalhar.- Comentou Alex, resistindo a vontade de gritar. Olhou para o laptop em sua mesa, e em seguida, a olhou novamente.- Conseguiu terminar todas as papeladas?- - Todas. Estão todas no sistema, pode conferir.- Respondeu a garota, erguendo o canto da boca em um sorriso cínico. Alex estreitou os olhos, encarando-a com confiança. A quantidade de trabalho que a designou, era para no mínimo Cora ter levado à tarde inteira, e quiçá a noite, mas a jovem não parecia nada cansada. - Você trapaceou, sua peste. Quem foi que te ajudou?- Perguntou o homem. - Ah, Alex, assim você me ofende.- Cora levou a mão ao peito, em um gesto dramático.- Por que acha que eu não cumpriria com o meu trabalho? Deixei de ir ao shopping por causa disso. Não sei se você sabe, mas tenho um jantar muito importante na sexta-feira. A enteada do meu pai…- - Chega, Coraline, não me venha com enrolações. Você é trapaceira, sempre foi, desde pequena. Deveria usar toda a sua inteligência e astúcia para o seu próprio bem.- - E desde quando você virou um amigo conselheiro? Fala como se fosse o meu avô.- Cora refletiu um pouco melhor a respeito de suas próprias palavras.- Na verdade, o meu avô é bem mais moderno e extrovertido do que você.- - Não vai conseguir nada me insultando.- Falou Alex, dando tapinhas na nova pilha de papéis que estava ao seu lado direito da mesa. Cora arregalou os olhos, aquela papelada estava bem maior do que a do dia anterior. - Ah, vejo que ficou surpreendida.- Comentou o rapaz, com sarcasmo.- Agora deixe-me dizê-la que terá que terminar tudo isso aqui.- - Eu vou levar o dia inteiro, e talvez a noite.- Protestou Cora. - Ah, mas não se preocupe. A algumas quadras daqui eles fazem um delicioso suflê de batatas com brócolis, e adivinhe o melhor de tudo? O restaurante trabalha com entrega.- - Você é um maldito sádico.- - E você uma menininha chorona que vai sair daqui correndo contar para o papai que está sendo maltratada por seu chefe.- Ele esboçou um sorriso torto com os lábios. - Você não é o meu chefe.- Rosnou Cora.- É um porco chovinista que está aproveitando algumas horas de poder. Mas sabe o que vai acontecer? Eu vou fazer essa m.e.r.d.a inteira e vou mostrar que sou melhor do que você.- Ela inclinou o rosto para frente, tentando parecer intimidadora. Alex continuou a encará-la com uma expressão inescrutável, divertindo-se com a raiva da mesma. - Porco chovinista? Eu não sou tão extremo assim, estou até sendo bonzinho com você. Por exemplo, hoje poderia te colocar para trabalhar na linha de produção de iogurte, e é o que vou fazer se continuar com esse mau comportamento.- - Alex…- Cora trincou os dentes, tentando alertá-lo que estava prestes a explodir. - Além do mais… Se você quer ser melhor do que eu, é porque realmente deve me achar muito bom.- - Eu te acho muito bom, sim. Muito bom em ser insuportável.- Rosnou Cora, desviando de Alex, que estava na frente da mesa, para segurar uma das gigantescas pilhas. Alex segurou a outra após Cora se afastar, e a seguiu até a mesa que ela estava caminhando. - Se quer passar mais tempo comigo, Alex, me convide para um jantar.- Cora tamborilou os dedos no queixo, pensando melhor.- Ou para fazer compras. Você tem um péssimo gosto para paletós.- Ela se virou de frente para o rapaz, analisando o figurino dele com desdém. - Ah, isso não é verdade. Pode usar qualquer argumento para me insultar, menos a forma com que eu me visto. Ganhei até uma matéria em um jornal londrino.- - Os ingleses sempre foram conhecidos por terem mau gosto.- Rebateu Cora. Alex ergueu uma das sobrancelhas, lançando um olhar interrogatório para a mesma. - Tem certeza que esse conceito não parte apenas de você?- - Vá para o inferno, Alex.- Cora tornou a se virar para frente, sisuda.- E espero que o suflê de batatas com brócolis seja gostoso. Já que vou ter que te suportar por horas, ao menos não quero passar fome.- Alex se limitou a apenas sorrir. Até que trabalhar com Coraline King-Lenox não seria tão r.u.i.m como estava imaginando. Como Alex imaginou, foram horas e mais horas árduas de trabalho. Além da quantidade de papelada para revisar, Cora resmungava a cada minuto que precisava digitar uma daquelas folhas. Até que, milagrosamente, em algum momento a garota pareceu achar interessante o que estava fazendo. Alex levantou a cabeça umas sete vezes para verificar se Cora estava cumprindo com o que lhe foi designado, e em todas as vezes, a jovem estava altamente concentrada, averiguando os papéis. - Isso é muita falta de estratégia.- Reclamou Cora, parecendo indignada. - Posso saber o que houve?- Perguntou Alex, desviando os olhos da página de arquivos que inspecionava em seu computador. - A iogurte King-Lenox não investe muito em marketing, por isso os lucros reduziram 5%. No mundo de hoje, quem não se enquadra no mundo digital, morre nadando na praia.- Explicou Cora, pousando a folha que tinha terminado de digitar, no outro lado. Alex piscou os olhos, aturdido. - É uma boa metáfora, mas não fazia ideia que entendia de números. Como conseguiu calcular os lucros tão rápido? Só não digo que você olhou, porque a pasta de lucros fica em outro lugar. Essa só mostra o número de vendas.- - Sou boa em matemática, sempre fui. Faço contas altas de cabeça, como acha que consigo comprar tantas peças de alta costura por um preço justo? Quando as pessoas olham para mim pensam “ lá vai a garota rica e burra, torrar todo o dinheiro do pai”, e é aí que me subestimam. Querem me empurrar peças das estações passadas pelo preço das novas, e inventam um desconto de 2% achando que eu não vou perceber o quanto o valor reduziu.- Por mais que Alex não costumasse prestar atenção nas futilidades ditas por algumas mulheres, o argumento de Cora era muito inteligente. Se tratava de um bom entendimento de matemática básica, e também, de moda. Alex sempre foi um homem vaidoso, sempre gostou de moda. - Tem ideias que possam melhorar nossas estratégias comerciais?- Cora inclinou o corpo para frente, encarando Alex com malícia. - Acha que eu te diria isso se já não tivesse pensado em um milhão de coisas? Eu sempre tenho respostas para os meus protestos.- Respondeu Cora. Alex balançou a cabeça positivamente, satisfeito com o comportamento empreendedor da jovem. - Tenho uma boa proposta para você. Vou marcar uma reunião com o seu pai e os outros acionistas, você vai falar sobre suas ideias e se forem boas, tenho certeza que vamos apostar nelas.- - E qual a proposta?- - Não precisa terminar tudo isso hoje. Uma outra parte fica para amanhã.- - Ótimo. Mas ainda vou querer o jantar, e é você quem vai pagar.- Retrucou Cora. Alex ergueu uma das sobrancelhas, encarando-a com incredulidade. - Não está querendo um pouco demais?- - Meu pai cortou os meus cartões de crédito.- Disse Cora, desanimada. - Tudo bem, eu pago o jantar, mas só dessa vez, não vá se acostumando.- Alex ergueu o indicador, adquirindo um tom imperativo.- E veja por um lado positivo. Nessa reunião, poderá mostrar sua competência. Seu pai vai ficar orgulhoso do seu empenho e interesse pelos negócios da empresa.- - É, se eu conseguir barganhar, talvez saia dessa penúria. Além do mais, pela primeira vez estou gostando de me sentir uma mulher de negócios.- - Então, mulher de negócios, voltemos ao trabalho. Vou agora mesmo marcar essa reunião.- Alex segurou o telefone que ficava ao lado do computador, ligando para a sala de Ethan King-Lenox. … Eram aproximadamente seis horas da tarde quando Cora e Alex cumpriram com os seus afazeres. Como o combinado, o rapaz pediu o suflê de batatas com brócolis para o jantar, e ambos se direcionaram para a mesinha no canto da porta, onde Alex costumava fazer suas refeições. O rapaz levou as quentinhas, pousando-as na mesa, já Cora, segurou a jarra de suco. O primeiro desastre do dia aconteceu quando Alex se virou abruptamente para trás, dando um encontrão com Cora, que estava poucos centímetros parada atrás dele. Em consequência daquilo, o líquido azul-arroxeado do suco de blueberry respingou sobre a blusa de amarração branca feminina, manchando toda a região torácica. - Que d.r.o.g.a.- Resmungou Cora ao ver o estrago. Devido ao tecido ser branco, era possível ver a cor do sutiã da moça - também branco, como a peça de cima-. Alex engoliu em seco quando, ao olhar diretamente para o lugar do acidente, viu o formato médio e bem desenhados dos s.e.i.o.s de Cora. O mal do homem era ser visual demais, principalmente quando tinham a mente fértil, como Alex. Foi impossível não imaginar todas as coisas que poderia fazer se colocasse as mãos ali - não apenas as mãos-. - Alex!- Falou Cora, irritada. Aquela ja era a terceira vez que o chamava sem obter resposta. O rapaz continuava com o olhar perdido em um lugar do qual não deveria olhar. A voz de Cora o tirou de seu estado de transe, fazendo-o pigarrear, desconcertado por ser flagrado daquela forma. Ou Cora não percebeu no que Alex estava prestando atenção, ou foi educada demais para não jogar aquilo na sua cara. - Perguntei se não tem alguma camisa extra para me emprestar, não tem condições de eu ir para casa nesse estado.- Prontamente, Alex tirou o paletó, entregando-o para Cora. Continuou com a camisa branca por debaixo, aquilo seria o suficiente para deixá-lo bem vestido. A garota soltou as amarras de sua blusa, tirando-a de imediato. Agradeceu mentalmente ao perceber que o líquido não havia manchado o sutiã. - Por sorte, uma das lavadeiras da minha casa conhecem um segredo para tirar manchas de qualquer peça branca.- Disse Cora, vestindo o paletó de Alex. Automaticamente o rapaz trancou a respiração, não contava com o fato de que a garota iria se despedir na sua frente. Cora fez tudo de uma forma tão natural, que ele duvidou muito que existisse alguma malícia por detrás daquilo. - É, que sorte, não é?- Comentou Alex, parecendo nervoso. - Algum problema?- Cora enrugou a testa e encarou Alex, percebendo que algo o estava incomodado. - Nada.- Ele pigarreou, mais uma vez.- Vamos jantar de uma vez, depois disso eu vou te deixar em casa. Tenho um encontro com a minha noiva mais tarde.- - Ah, sinto muito. Se eu soubesse disso não tinha pedido para que comprasse o jantar.- - Combinado é combinado. Além do mais, ela sabe como funciona o meu trabalho.- Alex arrastou uma das cadeiras da frente, gesticulando para que Cora se sentasse. - Passar um tempo na Inglaterra te deixou mais educado.- Cora não resistiu a oportunidade de provocá-lo, acomodando-se, em seguida, no assento.- É admirável que a sua noiva não viva atrás de você aqui na empresa. A mulher do meu pai costumava vim todos os dias, começou a parar de frequentar quando, estrategicamente, ele a ofereceu um emprego.- Cora bufou com impaciência.- A Victoria não suportaria ter que substituir um dia no SPA por um cargo aqui na Iogurte King-Lenox.- - Não gosta mesmo da sua madrasta, não é?- Alex se sentou ao lado dela, tomando a iniciativa de abrir as quentinhas. - Não, não a suporto. Tanto ela quanto a filha insuportável só existem para infernizar a vida. Tudo o que sabem fazer é gastar mal o dinheiro do meu pai, além de tentarem de tudo para me intrigar com ele.- - Não as conheci. Quando seu pai casou de novo, eu já estava em Londres. Não acha que se conversar com elas, pode ao menos tentar uma boa convivência?- Cora deixou escapar uma risada desdenhosa, brincando com o suflê ao usar o garfo para fazer um amontoado. - Conversar? Com Victoria e Marina? Acredite, o meu gato Philip é bem mais inteligente e compreensivo do que aquelas duas.- Alex ficou calado, imaginando a coincidência dos nomes. Sua namorada se chamava Marina, e a mãe dela também era Victoria. Claro, eram nomes comuns que existiam aos montes nos Estados Unidos, e Alex tinha certeza de que, se Marina tivesse alguma ligação com os King-Lenox, provavelmente o diria, visto que Ethan King-Lenox era famoso por toda América do Norte e também pelo Canadá, em breve, pretendendo expandir os negócios para a Europa. Ele não havia dito ainda a respeito de sua ligação com a família. Em toda a vida as mulheres sempre se aproximavam de Alex por conta de suas ações na King-Lenox, além da relação estreita que os Windsor tinha com a família. Pretendia contar tudo para Marina no dia do jantar de noivado, claro, explicando para a mesma o motivo de não ter revelado a verdade antes. Alex já teve uma noiva, Susana Jackson, conhecida agora como Susie Jackson, uma das maiores influenciadores digitais a nível mundial. Antes de tudo, ela era filha de um casal de advogados e conheceu Alex na faculdade de direito, da qual, mais tarde, ela acabou trancando para estudar moda. Os dois chegaram a namorar, e mais tarde, Alex descobriu que Susie só estava com ele devido ao prestígio social. Ele estava verdadeiramente apaixonado pela moça, e aquilo foi como uma punhalada nas costas. Por esse motivo, Alex decidiu terminar os estudos em Londres, e refazer a vida por lá. Precisava estar longe o suficiente daquela mulher para não ter uma recaída. - Alex.- Falou Cora, cantarolando.- Posso saber o porquê do silêncio repentino? Parece estar pensando em como acabar a fome mundial, e vindo de você, confio que isso possa ser verdade.- - Estava pensando em como o nosso sobrenome e fortuna podem atrapalhar nas nossas relações pessoais.- - É verdade.- Concordou Cora, após pensar um pouco.- Por isso eu tive a sorte de encontrar com o Anthony. Ele é tão bem posicionado quanto eu, e é perdidamente apaixonado por mim.- - Mas e você? É perdidamente apaixonada por ele?- Cora abriu a boca para responder, mas a fechou em seguida. Acabou constatando que não sabia daquela resposta. Ou talvez soubesse, mas não tinha coragem de admitir. - Nos entendemos muito bem. Isso é tudo que importa.- Disse a garota, por fim. - Será que é mesmo?- Contestou Alex, pensativo quanto aquilo.
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