- Henrique... - Sou impedida de dizer qualquer palavra, recebendo um longo e intenso beijo de seus lábios.
- Ei, você é maluco?! - Grito o empurrando para longe de mim.
- Me desculpe, não gostou? - Indaga e lhe olho desacreditada com sua pergunta.
- Quer que eu diga que gostei? Cara, você me beijou sem eu deixar! O que está acontecendo com esse mundo!!
- Exclamo abrindo os braços e todos me olham, buscando entender o que acontecia ali.
- Foi mau, pensei que sentia alguma coisa por mim. Vivia se mostrando gentil, me desculpe, acabei confundindo.
- Parece que confundiu mesmo! - Eu até achava ele bonito, poderia mesmo estar sentindo alguma coisa, mas, não lhe havia dado o direito de me beijar sem eu permitir.
- Elisa, por favor. Me desculpe. - Sussurra arrependido.
- Tudo bem. Desculpa pelos gritos, não estou acostumada a receber beijos roubados assim. - Digo e Henrique assente, forçando um sorriso.
- Vou te levar até o seu trabalho. - Diz e maneio a cabeça em negação.
- Não precisa, vou caminhando. Para o almoço assentar, digamos assim. - Falo acenando e já andando rapidamente, para não correr o risco de ser beijada novamente.
- Ei o que aconteceu? Vieram me avisar que você estava gritando no restaurante.
- Suellen diz, ao me ver passar pela porta e caminha em minha direção.
- O Henrique lascou o beijo na minha boca, do nada. - Falo ainda impactada e Suellen ri, achando graça.
- Que isso em! Ah como eu queria um beijo roubado, não ganho nem emprestado ultimamente. - Se escora no balcão.
- É normal os caras saírem beijando as mulheres sem pedir? - Indago e Suellen me olha com desdém.
- Você é muito santinha, Elisa. É romântico um beijo roubado, sabia? - Gesticula as mãos, fazendo careta. Como se dissesse "Desenformada".
- Eu diria que é assédio, mas, se está me falando que é romântico. Pensamos diferente mesmo. - Respondo.
- Vou dar uma dormidinha, quem sabe não sonho com um gato me roubando um beijo.
- Ri rebolando até o vestiário. Não sei como Suellen ainda não fora mandada embora, ela só vem para cá dormir.
Sinto meu telefone vibrar em meu bolso, atendo rapidamente ao ver que era Mateus.
- Lisa, Oi! Ainda está de pé o nosso passeio?
- Pergunta e fico em silêncio por alguns segundos.
- Não sei Mah. Eu preciso chegar em casa e ver como minha mãe está.
- Liguei para minha avó, ela disse que sua mãe está bem. Eu preciso lhe contar uma coisa importante, por favor...
- Tá bom, nos encontramos a sete!
- Isso! Amo você.
- Também amo você.
Desligo e sorrio. Fazia tanto tempo que eu não saia para lugar nenhum, mamãe sempre fora a minha prioridade e nunca me arrependi disto. Ela sempre cuidou de mim quando eu era pequena, havia chegado a minha vez de retribuir.
As horas se passaram e meu coração começara bater acelerado, eu estava tão animada e ansiosa pelo que Mateus queria me mostrar. Desde pequeno ele sempre fora o garoto das grandes surpresas, vivia me surpreendendo até o dia que nos casamos em baixo da macieira, ele além do noivo também fora o pastor, as floristas e o padrinho.
- An...Elisa, preciso que fique até às 18:00, teria como? - Louise indaga e meu coração desacelera.
- Eu preciso buscar os remédios de minha mãe, hoje fecha as dezoito horas em ponto.
- Falo um pouco temerosa.
- Sabe que só tenho você, a Suellen só vem para cá dormir. - Murmura entre os dentes. Respiro fundo e sorrio.
- Tudo bem. Posso ficar um pouco mais.
- Digo e ela agradece, abraçando-me. Não estava nadando em dinheiro, para ficar dispensando ordens da chefe.
- Então vou indo, hoje tem um concerto no museu. Será de piano, tiro umas fotos para você! - Acena e forço um sorriso, revirando os olhos após vê-la sair para fora, entrando em seu carro chique.
- Também estou indo, já deu meu horário.
- Suellen surge com sua bolsa e casaco.
- Não Suellen, fique aqui comigo. Nunca conto a Louise que você fica no banheiro dormindo.
- Não conta porque é boba, eu não faria o mesmo por você. - Revela rindo de forma maléfica. - Agora vou indo, assistir o concerto pela televisão. - Faz bico, caminhando até o ponto de ônibus. Respiro fundo, me escorando no balcão.
- O Senhor deve estar preparando algo muito grande para mim, viu. - Suspiro dizendo aos céus. Com certeza, Deus riu.
Como de costume, sou obrigada a ficar até mais tarde por nenhum motivo, já que depois das 17hras ninguém sai para comprar jóias.
Finalmente o relógio me avisa, que a liberdade cantou para mim. Pego todas as minhas coisas, apago todas as luzes, ligo o alarme e fecho as portas uma de vidro e outra de ferro. Olho em meu celular 18hras em ponto, saio correndo em direção ao posto de saúde na luta para encontra-lo aberto e conseguir os remédios de minha mãe, que não vive sem.
- Ah não!!! - Grito ao ver os portões fechados e um bilhetinho: "Voltamos amanhã, às 7hras da manhã"
- Porque, paizinho celeste?!! - Choramingo irritada. Meu telefone toca um hino da harpa. Mamãe havia mexido denovo no meu telefone.
- Mateus, não posso falar agora. Estou com raiva!! - Esbravejo e ele ri, zombando de minha tristeza.
- Seu humor irá mudar logo, me encontre no teatro.
- No teatro? O que vamos fazer em um teatro? - Questiono.
- Comer paçoca! Vamos assistir uma peça, tonta.
- Uma peça? Mateus, não temos dinheiro nem para ir no cinema.
- Para de reclamar da vida e vem logo, estou lhe esperando na porta dos fundos. Quando chegar, dê dois toques na porta.
- Tá, Tá! Olha, eu não posso ser presa, entendeu?
- Tá bom, qualquer coisa digo que fui eu. Já que sou o branco da relação. - Diz por fim, desligando o telefone. Após chorar um pouco mais, estendo a mão para um ônibus e adentro, sentando-me no último banco.
Ao chegar, desço na frente daquele enorme teatro na cidade de São Paulo, posso dizer que todo meu corpo sorri, imaginando se um dia seria a minha vez de apresentar-me naquele lugar. Olho para o fundo do teatro e vejo a cabeça de Mateus, que acena a chamar-me.
- Vem. - Cochicha e corro até lá.
- Mateus, não tenho roupa para esse lugar.
- Falo, olhando meu modelito, vendedora de semi-jóias. - Como conseguiu ingressos?
- Não tenho ingresso, mas, tenho amigos.
- Acena para um homem gordinho e careca, que parecia ser o faxineiro do local.
- Menino Mateus, ninguém pode saber que vão estar lá, se não sou demitido. - O homem diz, entregando algumas chaves para o meu amigo.
- Não se preocupe, vamos fazer silêncio. Vê se não chora, Elisa. - Diz e concordo com a cabeça. Na verdade minha cabeça estava bem confusa, sem entender o que iria acontecer ali. Mateus me puxa pela mão, onde subimos uma alta escada chegando até o fim das galerias.
- O que estamos fazendo aqui? Se alguém nos ver, seremos enchotados. - Sussurro e ele ri, subindo uma outra escada, que dava próximo ao teto do teatro, onde ficava algumas aparelhagens escondidas de todos.
- Vem, sobe aqui. Hoje você verá um concerto pela primeira vez. Ah, estamos na melhor fileira. - Sorri travesso. Tiro meus saltos e subo com sua ajuda, sentando-me ao seu lado, ficando com os pés a balançar.
- É concerto do que? - Pergunto e Mateus permanece em silêncio, apontando para o palco. Quando uma mulher se senta atrás de um piano e começa a falar.
- Boa noite a todos, que essa noite seja inesquecível. - Fala suavemente, pondo suas mãos sobre aquele lindo piano branco e cumprido. Seus dedos tocavam tão levemente sobre as teclas, que pareciam dançar e voar em cada uma delas.
- E então, gostou da surpresa? - Sussurra em meu ouvido e movo a cabeça concordando, em meio as lágrimas que desciam por meus olhos.
- Nunca vi nada mais lindo. - Lhe respondo e Mateus segura minha mão, ficando assim como eu em silêncio, admirando aquela maravilha.
- Não senhor, está tudo vazio aqui!
- Ouvimos a voz do faxineiro ecoar pelas galerias.
- Me avisaram que dois jovens subiram até aqui, ei, vocês aí!! - Um homem enorme grita. Mateus e eu nos entreolhamos e sorrimos, começando a descer as escadas e correr na direção oposta do segurança.
- Venham aqui, seus baderneiros! - Continua a gritar e só conseguimos rir, então saímos de dentro daquele lindo sonho.
- Foi incrível!! Muito obrigada, essa foi a melhor noite da minha vida!! - Esbravejo pulando nos braços de Mateus que ri, me rodopiando pelas ruas.
- Que bom que gostou, queria que essa noite fosse inesquecível para você. Quero levar seu sorriso comigo. - Diz e paro de sorrir, olhando em seus olhos que se encontravam marejados.
- Como assim? Levar o meu sorriso?
- Indago sem entender. Mateus aproxima-se, segurando minhas mãos.
- Eu vou embora, Lisa. A Emma e eu, vamos nos casar. - Diz, fazendo toda a minha noite se escurecer.
- Mas, vai me deixar aqui sozinha? Não pode fazer isso, eu sei que a ama, mas, eu também te amo!
- Eu sei, porque também amo você. Mas, eu encontrei nela tudo que busquei a minha vida toda.
- E o seu trabalho? Como vai fazer? Você tem dinheiro para se mudar, assim do nada?
- Questiono tentando encontrar um motivo para que ficasse. Mateus sempre foi meu porto seguro, como eu ficaria sem ele me dando equilíbrio?
- Eu consegui um empréstimo no banco. A empresa onde estou, abriu uma filial na Holanda. Quando vi todas essas coisas acontecendo, percebi que era Deus confirmando os planos que projetei.
- Eu vou sentir tanta saudade. - Confesso me desfazendo em lágrimas. Mateus me abraça, buscando acalentar meu coração.
- Olha, eu vou chegar lá e assim que marcar o casamento, mando te buscar. Tá bom? Vai ser minha madrinha.
- Não posso deixar minha mãe, seu maluco.
- Falo e ele ri.
- Eu vou pagar a viagem de vocês duas, eu fui promovido, Elisa! E minha noiva é rica!
- Exclama animado e me dou por vencida, aceitando uma fatia de sua alegria.
- Vou te levar em casa, no meu carro novo!
- Diz apontando para uma bicicleta e sorrio, sendo puxada pela sua mão.
Aquela noite sem sombra de dúvidas poderia ter sido marcada como a melhor de minha vida. Eu havia ido pela primeira vez a um concerto de piano, meu melhor amigo estava completamente feliz e eu...bom, eu o amava demais para não me sentir da mesma forma que ele, completamente e totalmente feliz. Mas, algo aconteceu e impediu que aquela noite fosse a mais feliz, eu me destruí por inteiro, perdi uma parte do meu coração e da minha alma.
- Mamãe, eu cheguei! - Exclamo ascendendo as luzes de casa. Um silêncio permeia toda a casa. Passo pela sala, depois cozinha e sigo até o nosso quarto.
- Mãe, tenho tanta coisa para lhe contar, o Mate...mãe? Mãe? - Lhe chamo ao vê-la deitada no chão, com os olhos fechados.
- Mãe!! Mãe, não, não, por favor...a senhora não pode estar fazendo isso comigo, não!! Eu não aceito, acorde!!! - Esbravejo lhe pegando em meus braços, sua respiração ainda existe mesmo fraca.
- Elisa? Ei...O que aconteceu? - A voz de Mateus surge dentro de minha casa.
- Ela...ela, chame uma ambulância, ah meu Deus!! Não!! Mamaezinha, por favor, não se vá!