Destino ou coincidência?

1719 Words
Julia Estou atrasadíssima para a minha primeira aula, espero que o professor seja gente boa e não me dê falta. Talvez se eu explicar o que aconteceu, ele compreenda. Saio correndo do Shopping, pego um táxi para poder chegar logo a Universidade, pois de ônibus demoraria muito e eu me atrasaria ainda mais. O trajeto de táxi leva menos de 15 minutos, caminho depressa em direção a minha sala do mestrado, bato levemente na porta e entro já me desculpando com o professor: ― Com licença professor, me desculpa o atraso, eu fiquei presa no elevador do shopping... Eu... ― fico sem palavras ao constatar que o professor, o meu professor, é o cara do guarda-chuva e do elevador. Me pergunto como ele deve ter chegado até aqui tão depressa. Se bem que isso não é importante agora. Estou congelada em frente a porta aberta atrás de mim, com a boca escancarada e olhos arregalados. Ele também parece surpreso, mas parece estar se divertindo com a situação. ― Por favor, feche a porta e sente-se. Nós ainda não começamos. ― diz ele, sendo profissional. Aceno e fecho a porta. Me sento em um assento vaga na primeira fileira. Só então percebo que os outros alunos estão com os olhos presos em mim. Ignoro-os e ajeito meus materiais sob a mesa. "Que coincidência terrível" penso. "Como assim ele é o meu professor? Não. Isso não pode ser coincidência. Não acredito em coincidências". A voz dele, interrompe os meus pensamentos: ― Bom dia, pessoal. ― começa ele, dirigindo-se a toda a sala e se sentando sob a ponta de sua mesa. ― Peço desculpas novamente pelo atraso. Gostaria de me apresentar: O meu nome é Danilo, tenho 31 anos e serei o professor de vocês na disciplina de Literatura Brasileira, durante todo esse ano. Sou graduado em Letras, mestre em Literatura e doutor em Tradição literária e Cultura Escrita.  "Ele é muito f**a", penso admirada. ― Trabalho nesta Universidade a pouco mais de dois anos. Agora, gostaria de ouvir um pouquinho de cada um de vocês. Podemos começar por você? ― diz ele, olhando para mim. "d***a, porque fui me sentar bem na frente?".  ― É claro. ― digo com um sorriso. ― Me chamo Júlia, tenho 23 anos. ― ele me encara com curiosidade. "Será que ele que eu diga mais alguma coisa? Acho que o senhor já sabe muito sobre mim, professor".  ― O que mais quer saber? ― pergunto um pouco constrangida. Uma moça de cabelos loiros que está sentada ao meu lado, ri com desdém. Me volto para ele e a fuzilo com olhar. Ela me encara em sinal de desafio. ― Qual a sua graduação? ― pergunta ele, com tranquilidade. ― Sou graduada em Letras e pós-graduada em Letras-Inglês. Todas concluídas nesta mesma Universidade. ― respondo, um pouco mais calma. O olhar dele me passa tranquilidade. ― Interessante, Júlia. ― ele pronuncia o meu nome, sorvendo cada sílaba. ― Você tem um vasto leque de opções na qual poderá atuar. Qual sua área de interesse? ― "Porque ele está me fazendo tantas perguntas? Pensei que fosse uma apresentação pessoal simples e rápida". ― Eu já atuo na área editorial como estagiária. Pretendo me aprofundar neste ramo. ― Muito bem. Tenho certeza que obterá sucesso. Agora, você. ― ele indica a moça que a pouco estava rindo de mim. Sinto que já a odeio. Ela se empertiga toda na cadeira onde está sentada, endireitando a postura.  ― O meu nome é Pamela. Mas pode me chamar de Pam. ― "Fala sério" ― Tenho 23 anos e sou graduada em Letras... "Bla, bla, bla". Nem me dou ao trabalho de prestar atenção ao que ela está dizendo. Ela fala gesticulando excessivamente com as mãos, inclinando-se toda hora para a frente, expondo o decote generoso.  ― Muito obrigada, Pamela. ― fala o professor. Pelo visto, ele não é de se deixar seduzir facilmente. Não que eu tenha nenhum interesse nisso. Mas, admito que saber que o meu professor é o gato que me ajudou duas vezes hoje, me deixa muito nervosa.  ― Prosseguindo com as apresentações, você. ― Ele aponta para mais um aluno. Um a um, cada aluno vai fazendo sua apresentação pessoal. Como a sala é pequena, logo as apresentações se encerram. ― Agora que já nos conhecemos, vamos iniciar a nossa aula com a pergunta que não quer calar: Capitu traiu ou não traiu Bentinho? ― Fala ele, sorrindo. "E que sorriso é esse, gente?".  ― A pergunta de um milhão de dólares. ― digo. Ele ri divertido. ― Sim, essa é a pergunta que todos querem saber, mas pouquíssimos tem certeza da resposta. Qual a sua opinião? Traiu ou não traiu? ― ele me pergunta, me olhando com expectativas.  Respiro fundo. "Como é que eu vou dizer, que Bentinho era um lunático?" ― Como o senhor mesmo disse, poucas pessoas têm certeza da resposta. Não dá para ter certeza. Mas, na minha opinião, Capitu não traiu bentinho. ― ele me encara, interessado. ― Continue. ― Bentinho era uma criatura excêntrica, podemos dizer que era, até mesmo, alucinado. No meu ponto de vista, tudo não passou de uma alucinação da cabeça dele, acredito que ele tenha confundido os fatos dentro de sua mente conturbada e tenha acabado enxergando algo que nunca existiu. Ele assentiu, pensativo. ― Muito bem, Júlia. Ponto de vista, interessante. Vou pensar sobre isso. Alguém mais tem uma opinião sobre o assunto em questão? A aula segue com tranquilidade. Ainda estou surpresa com os desígnios do destino. m*l posso esperar para contar a Helen sobre tudo o que aconteceu hoje. Helen, é minha colega de trabalho e única amiga que tenho. Fizemos a graduação juntas e conseguimos um estágio na mesma editora. É para ela que conto tudo o que acontece comigo, pois ela sempre se mostrou uma boa e fiel amiga. Ao final da aula, atraso a minha saída para tentar dar uma palavrinha com o professor Danilo. Agora, ele já não é mais um lindo desconhecido, mas sim um professor que possui uma beleza estonteante. Quando todos os alunos já saíram, vou até ele: ― O senhor acredita em coincidências? ― pergunto com um sorriso. Ele dá um sorriso largo e me olha nos olhos. ― Engraçado, né? Mas, não. Eu não acredito. ― ele me responde, enquanto guarda suas coisas dentro da mochila. ― Nem eu. Bom... até a próxima aula, professor. Tenha um bom dia. ― Igualmente, Julia. Espera... ― Eu já estava no corredor quando ouço sua voz me chamar. ― Sim? ― Onde está o seu guarda-chuva? O GUARDA-CHUVA! Vejo que não estou segurando ele. d***a! Olho para o lugar onde eu estava sentada e está vazio. Eu devo ter esquecido no táxi. "Que mancada, Júlia, ele disse para eu cuidar bem dele e agora ele está por aí, perdido." Meus olhos se encontram com o do professor e percebo que ele me encara com expressão divertida. ― Acho que você deve ter esquecido no ônibus. ― diz ele, com tranquilidade e os lábios curvando em um sorriso. ― No táxi... Eu esqueci no táxi. ― respondi um pouco atordoada e envergonhada também. ― Me desculpe. ― Desculpar o que? ― Por perder seu guarda-chuva. ― O guarda-chuva que você perdeu não era meu, Júlia. Eu dei ele a você, então era seu. Você perdeu seu guarda-chuva. Não me deve desculpas. ― Certo... Mesmo assim, eu sinto muito. Ainda bem que parou de chover. ― digo me sentindo um pouco melhor. ― Bem, eu preciso ir. Até mais, professor. Ele acena e eu me afasto me sentindo ridícula. "Como eu posso ser tão atrapalhada assim, Senhor"?. Ele com certeza, deve me achar uma maluca. Ainda mais depois do que ele viu essa manhã no ponto de ônibus. Aposto que me apelidou de " A maluca do guarda-chuva" e vai se divertir às minhas custas contando para os amigos e até mesmo para a namorada. "Será que ele tem uma?" "E porque isso deveria importar pra mim? Na verdade não importa".  Irei passar no shopping para almoçar, depois vou direto para a editora. m*l posso esperar para contar a Helen as novidades. Danilo De repente a porta da sala de aula se abre e quem entra? Ela mesma, a moça do guarda-chuva. Não pode ser coincidência. Estou tão surpreso quanto ela, mas não demonstro. Ela já entra se desculpando sem nem mesmo olhar para quem está em frente à classe. Fica paralisada com a porta aberta atrás de si, sem saber o que fazer. Quando ela se senta, noto que está sem o seu guarda-chuva. O guarda-chuva que dei a ela mais cedo. Um pouco atrapalhada, começa arrumar os materiais sobre a mesa. Eu inicio a aula me apresentando e pedindo para que cada aluno se apresente para turma. Como ela está sentada na primeira carteira da primeira fileira, eu decido começar por ela. No início ela não parece muito contente em ser a primeira, mas depois se apresenta com desenvoltura, porém é curta e grossa e eu não sei porque desejava saber muito mais sobre ela. "Julia" então esse é o nome dela. Combina com ela de certa forma. Doce e delicado. Embora ela não seja nem um pouco delicada, eu tenho certeza. Surpreso me dou conta de já sei várias coisas sobre ela, como sua aversão a dias chuvosos, sua falta de paciência com guarda-chuvas ruins, seu pânico de lugares fechados, seu apreço pelo chocolate, enfim... Agora também sei seu nome, sua formação e PELO AMOR DE DEUS, sei que é uma das minhas alunas. Só de pensar que quase flertei com ela no elevador. Só esse pensamento chega a manchar minha carreira de sete cores diferentes. Preciso tirar essa menina da minha cabeça e tratá-la como só mais uma aluna. É isso o que eu preciso fazer. Mas, como? Se é tão difícil parar de olhar para ela? Tenho a sensação de que nos conhecemos de outras vidas, uma energia muito forte me atrai a ela, é quase sufocante de tão intenso. Só queria voltar a me sentir normal. Dou início a aula, com um questionamento muito levantado no meio literário. Sobre a suposta traição de Capitu contra Bentinho. E mais uma vez, Julia me surpreende ao mostrar seu ponto de vista sobre o assunto. 
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