06° Capítulo

1116 Words
DIEGO Quando eu aluguei esse apartamento há cerca de oito meses, não tinha noção de que as paredes eram tão finas e se soubesse, talvez não estivesse morando aqui e pensar nessa possibilidade não me agrada mais como antes, onde não existia uma vizinha doidinha e um cachorro que pensa que é gente. Eu escuto o choro dela através da parede do meu quarto e a minha ideia de dormir até as quatro vai por água abaixo. Isobel está falando com uma amiga, com certeza a garota alta e loira que sempre a visita, e mesmo sem querer acabo ouvindo a conversa das duas e o fato de somente agora ela ter percebido que seu namoro era abusivo. Relacionamentos podem ser destrutivos, eu sei disso mais do que ninguém. Já faz muitos anos, mas ainda assim fico reticente em relação a deixar outra pessoa entrar na minha vida e me ferir de novo. Quando você se abre para o amor, também tem que estar disposto a ser ferido no processo. Nunca sabemos direito o que esperar e só resta confiar para que tudo aconteça de uma forma boa. Ouvir o choro dela mexe comigo. Eu sei que não gosto de ver mulheres chorando, mas isso vem do fato de eu ter sido criado apenas por minha mãe e irmã mais velha e sempre que as duas choravam, eu sentia que deveria fazer alguma coisa para que as mulheres da minha vida ficassem felizes de novo. Fui criado para ser uma cavalheiro, no sentido mais clichê da palavra. Agora eu conheço Isobel um pouco melhor e ouvir o choro dela faz com que eu queira fazer alguma coisa. É por isso que eu levanto da cama, pego meu pote de sorvete caro no congelador e vou bater na porta dela,mesmo estando com muito sono e tendo esquecido de calçar alguma coisa. Ouço o latido da Dondoca e em seguida a porta é aberta e eu vejo Isobel usando um pijama de unicórnios, com os cabelos longos e escuros bagunçados e os olhos vermelhos, piorando suas olheiras. — Quer dividir? — pergunto e mostro o pote de sorvete de flocos. Ela apenas balança a cabeça e dá um passo para o lado e quando eu entro no apartamento com o mesmo tamanho do meu, sou surpreendido pela bagunça em que o ambiente se encontra. Tem roupas jogadas para todos os lados e não consigo ver coisa alguma no lugar certo. — Guilherme acabou bagunçando tudo ontem — ela explica baixinho. Não digo nada e sento no sofá. — Vou pegar as colheres. Isobel sai e me deixa sozinho com a pinscher. A cachorra me olha de um jeito que eu considero ameaçador e começa a andar lentamente em minha direção. Em um ato involuntário ergo meus pés, mas o bicho continua se aproximando. Penso no que farei caso seja atacado, mas a cachorra doida corre e pula no sofá e então em cima de mim. Por um segundo penso que irá desfigurar meu rosto, só que Dondoca começa a me lamber e em seguida se acomoda ao meu lado. — Você estava com medo dela? -Arregalo os olhos ao ver Isobel se sentar ao meu lado e engulo em seco. — Não exatamente, mas você sabe a fama dos pinscher, não é? — Dondoca é uma lady, Diego. Ela nunca atacaria ninguém. -Entrego o pote de sorvete para Isobel e, completamente receoso e com medo de perder meus dedos, acaricio a pequena cabeça de Dondoca, lembrando que seus latidos são responsáveis por me acordar todas as manhãs. Será que ela pode guardar ressentimento? Dondoca se esfrega na minha mão como um gato e dá lambidas em meus dedos, voltando a se acomodar em meu colo e fechando os olhos. — Eu não disse que ela é um doce?- Concordo, meio a contragosto, e olho para minha nova amiga, desejando que ela não mude de ideia e morda meu saco, ou então meus dedos.Isob abre o sorvete e por alguns minutos tomamos a sobremesa em silêncio. — Você me ouviu chorando? — ela pergunta baixinho. Penso em negar, mas ao olhar para o rosto dela, decido não mentir. — Sim — admito e mordo o lábio. — As paredes são finas. — Não quero que sinta pena de mim, Diego.-Sei que já pedi isso antes, mas não custa lembrar. — Não sinto pena de você, apenas sei o que está sentindo. -Ela me olha, parecendo não acreditar em minhas palavras. — Eu fui traído também. Faz muitos anos, mas ainda assim eu lembro da dor que senti e da forma como esse gesto mudou tudo o que eu pensava sobre o amor. — Qual sua idade, Diego? — Eu tenho vinte e nove anos e quando fui traído pela Andressa ainda estava na faculdade. E você? — Vinte e cinco. -Olho para Isob melhor, ela parece ter no máximo vinte anos com seus cabelos escuros e a pele clara.— Demora muito para esse sentimento de rejeição melhorar? — ela indaga baixinho, desviando o olhar. — Acho que é diferente para cada pessoa, mas de alguma forma ser traído muda a gente. — Você a amava? — Sim. — Eu acho que não amava mais o Guilherme. Eu tinha medo de ele terminar comigo e eu nunca mais encontrar alguém. — É normal ter medo, Isobel. — Eu sei, assim como sei que o que ele fazia comigo era abusivo, mas isso não diminui a dor das palavras que ele me disse. — Aquelas palavras foram cruéis e não te definem. — Será? E se tudo tiver um fundo de verdade e eu não passar de uma fracassada? — Você não é uma fracassada.- Isobel balança a cabeça e eu percebo que não acreditou em mim. — Você é bonita — digo com firmeza, fazendo com que me olhe ao tocar sua mão. — Você é linda, merece ser amada e é um sucesso. -Os olhos dela se enchem de lágrimas e ela morde o lábio. Sem hesitar, toco seu lábio inferior com o polegar, impedindo que continua a se machucar. — Você tem um amigo,Isobel, e eu irei te ajudar a passar por esse momento difícil e ter confiança. — Por quê? — Sei lá, acho que eu gosto de você e essa cachorra doida. Somos vizinhos no final das contas e eu meio que estou sentindo falta de você cantar todas as manhãs. — Mas eu só não cantei hoje. — Pra você ver como sua voz é viciante.- Isobel começa a rir e eu me sinto bem por ter sido o responsável por seu sorriso, na verdade ando sentindo muitas coisas em relação a essa garota.
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