ISOBEL
Neném, se você destruir esse meu coração não tem outro lugar para você morar.
Se alguém me dissesse que eu terminaria um longo namoro, ficaria bêbada e cantaria a plenos pulmões Gabi Martins ao lado do meu
vizinho rabugento chamado Diego, eu diria para essa pessoa averiguar se não estava usando nada tóxico. Só que é exatamente isso que está acontecendo.
Estou bêbada e cantando a plenos pulmões com Diego, que por sinal também está pra lá de Bagdá e canta melhor do que eu.
— Sabe, neném — ele cessa a cantoria e se deixa cair ao meu lado no sofá. — Até que suas músicas não são tão ruins assim.
— E eu não sei? — aponto para a grande televisão de tela plana que está com o Youtube aberto. — Você que é muito rabugento.
— Eu? Claro que não. Eu só gosto de dormir e você e aquela cachorra maluca nunca me deixam.
— Tem razão, eu sou meio inconveniente.- Acabo soluçando devido à enorme quantidade de bebida que ingeri e Diego começa a rir e por Deus, talvez eu esteja muito bêbada, mas esse cara é gostoso. Os olhos castanhos, os cabelos pretos e a pele bronzeada com músculos tonificados e uma boca que irradia pecado é quase demais para
uma garota carente ficar tão perto.Só que eu já cai na real e agora sei que sou f**a e gorda e que caras bonitos como ele só se aproximam de garotas como eu por pena. É
claro que ele ficaria com pena de mim também. Guilherme já havia deixado
claro a minha semelhança com cachorrinhos perdidos e agora as atitudes de Diego apenas comprovam a teoria dele.
— Acho... Acho que vou embora — digo e levanto, cambaleando um pouco na tentativa de me afirmar.
— Por quê? — ele tenta sentar, mas acaba escorregando e voltando a posição de antes, meio deitado e com as longas pernas esticadas.
— Não quer cantar Jorge e Mateus?
— Talvez outro dia. -Diego se esforça para manter os olhos abertos e eu acabo sorrindo
do seu jeito, sem nenhuma atitude turrona, ou palavras ácidas.
— Obrigada por ter sido gentil comigo. -Ele ergue o polegar em sinal positivo e eu cambaleio para fora do apartamento dele, dando poucos passos até o meu e encontrando tudo bagunçado.
— Dondoca? -Estou meio zonza da bebida e começo a me afirmar nos móveis a procura de minha pequena pinscher que, ao contrário do que Diego fala, não tem nada de demoníaca.
— Dondoca? Cadê você, bebê da mãe? -Ela nunca demora a aparecer quando eu a chamo e por isso começo a me sentir extremamente preocupada. Imagens dela correndo e caindo em algum lugar povoam minha mente e eu passo a procurá-la em cada canto do apartamento, mas somente quando chego a meu quarto e olho para o cantinho em que a caminha dela e os brinquedinhos ficam e encontro tudo vazio é que entendo o que aconteceu. Guilherme levou Dondoca embora com ele! O desgraçado deve ter achado que ela era sua propriedade por ter me dado ela de Natal. Começo a fungar, imaginando minha cachorrinha com ele e a tal
Dudinha. Isso não vai ficar assim!
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— É claro que eu tenho certeza de que foi ele quem pegou a Dondoca, Pamela. -É meio vergonhoso admitir, mas eu acabei dormindo no chão enquanto chorava pelo sequestro da minha cachorrinha e acordei horas depois
com gosto de sapato velho na boca. Arrastei-me para o banheiro, tomei um longo banho frio, coloquei pra dentro uma xícara de café preto e agora estou aqui na sacada encarando o céu nublado e falando com a minha melhor amiga que também está zangada com o i****a do meu ex-namorado.
— E o que pretende fazer, Isobel?
— Eu vou recuperar minha filha. -Suspiro, sentindo meu coração partido e a cabeça latejando. Odeio ficar de ressaca, ainda mais hoje que preciso pensar em uma forma de fazer com que Guilherme devolva Dondoca.
Foi graças a Pamela que descobri a traição dele. A prima dela trabalha com a Dudinha e quando Pam estava almoçando com a prima, a outra namorada de Guilherme se juntou a elas e começou a falar sobre Guilherme e o
bebê que teriam juntos. Pam começou a seguir Dudinha no i********: e viu a
foto. Ela enviou o print pra mim e a coisa toda acabou muito m*l, para o meu lado é claro.
— Você quer que eu passe por aí com o carro do meu pai e a gente vá até a casa do Guilherme recuperar a Dondoca?-Penso na proposta de Pamela e mordo o lábio, sentindo dor no machucado que fiz no dia anterior. Será que o desgraçado vai entregar Dondoca me vendo com minha amiga na porta da casa de seus pais? É meio constrangedor admitir, mas Guilherme é machista e acha que é dono do mundo.
— O Paulão não vai aí hoje? -Paulão é o noivo da Pamela. Os dois são professores de educação física e se conheceram no trabalho e ele é todo grandão, parecido com o The
Rock, menos o lance da dança dos peitinhos e tal.
— Ele está viajando com alguns alunos para um campeonato de futebol na cidade vizinha.
— Que d***a, amiga. Com Paulão era certeza que ele devolveria Dondoca porque Guilherme não seria doido de enfrentar um cara daquele
tamanho, ele preza muito o rosto perfeito dele.
— Eu também sei dar um cruzado de esquerda, Isobel. Não acha que nós duas somos o suficiente para aquele ladrão de doguinhos?
— Acho não.
— Então vamos ter que esperar o Paulão voltar. Estou decepcionada com sua falta de fé em nós.
— Eu conheço o cara com quem namorei nos últimos três anos.
— Infelizmente.
Conversamos mais um pouco e Pamela encerra a ligação, dizendo que precisa ajudar sua mãe com o almoço de domingo. Fico segurando o celular e pensando em minha família que mora no interior. Meus pais são
agricultores e eu vim para a cidade grande com a esperança de ter uma vida melhor e diferente da deles e do meu irmão mais velho, Luigi, mas as coisas não saíram como o esperado.
Papai teve um problema no coração que precisou de intervenção cirúrgica e eu abandonei a faculdade de administração para trabalhar em uma empresa alemã especializada em produzir carnes. Continuei morando longe da chácara e conheci Guilherme na época em que era assistente administrativa. Durante quatro anos trabalhei no escritório e metade do meu salário era para ajudar meus pais. Luigi casou ano passado com uma moça ótima e os dois passaram a morar com nossos pais e fizeram com que a chácara voltasse a prosperar e não precisando mais de mim financeiramente.
Sai da empresa e comecei a investir no meu sonho: uma loja de cosméticos. Ainda estou no começo, com a clientela se consolidando e os produtos ficando na lavanderia, mas as coisas estão dando certo e eu tinha orgulho do meu Delivery de maquiagens, isso até eu ter minha autoestima destruída e minha filhotinha roubada.
Seco meu rosto com as costas da mão, sentindo muita saudade de Dondoca. Guilherme me presenteou com ela quando eu disse que sentia falta de morar com outras pessoas. Meio que foi uma tentativa de a gente dar um passo adiante na relação e ele vir morar comigo, mas confesso que gostei
muito mais da companhia da pinscher.
— Está chorando de novo? -Tomo um susto ao ouvir a voz de Diego e coloco a mão no peito, olhando para o lado e vendo que ele está sentado na cadeira de balanço da sua
sacada.
—Não é pelo Guilherme, mas sim por Dondoca.
— O que ela fez agora? Comeu outro chinelo?
— Não. Aquele b****a a sequestrou ontem.- Começo a chorar e quando ouço um barulho meio engasgado, levanto a cabeça. Por um momento espero que ele também esteja solidarizado com o sequestro da Dondoca, mas Diego está rindo tanto que seu corpo todo sacode.
— Não seja malvado — peço entre soluços. — Sei que não gosta dela, mas aquela cachorrinha era minha única companhia. Eu a tenho como uma filha.
— Filha endemoniada só se for. -Meus lábios começam a tremer e eu, vergonhosamente, começo a chorar alto.
— Calma, Isobel. Desculpa. Eu estava brincando. Sinto muito que ele tenha levado a Dondoca. Tem algo que eu possa fazer- Afasto as mãos dos olhos e observo Diego, percebendo que ele é bem alto e forte, muito mais que Guilherme.
— Na verdade tem sim.
— Devo pedir piedade divina? — ele questiona, cruzando os braços e deixando seus bíceps em evidência.
— Nunca é demais. -Diego esbugalha os olhos conforme falo em que ele pode me ajudar e eu percebo, em cada gesto dele, que se arrependeu amargamente de ter me oferecido ajuda.